A pequenina gigante contra os terríveis olhos de desprezo…
Escondida do mundo… Ela assim pensava, porém por debaixo da mesa estava… A imaginar mil e uma histórias, no intuito de escapar do tédio que era estar ali. Entre um curiar e outro, tentava entender como poderia existir, gente de toda sorte e vaidade, alguns carregando olhos de sinceridade, outros, uma terrível face de desprezo… E ela ali, pequenina (desencontrada), em meio àquela sala, que ouvia, vez por outra, alguém dizer que era de aula… Mas que nem por um momento, até então, acalentava o seu mais que inquieto coração.
Apenas ir, comer, fingir e partir. Era assim no colégio, ao menos até os nove. Até que um dia (e que dia!), uma mulher revestida de coragem e paciência resolveu fazer mais que sua obrigação… Mergulhou fundo nas águas geladas, sem tanque de oxigênio e sem temer os perigos que pudesse haver em território tão obscuro, à procura daquela menina… Na verdade não se tratava de rio, e nem lago, mas o velho esconderijo, debaixo da mesa… O fato é que ela foi encontrada, e de lá, resgatada. Conheceu pela primeira vez, uma aula de verdade. Uma aula com amor.
A partir daquele dia a escola passou a ter cor, a fazer sentido, até mesmo sabor, quem diria… Não o suficiente para fazer os problemas do dia desaparecerem, mas agora ela sentia que dava pra resolvê-los… Mesmo que demorasse e assim custasse inúmeras gotas de suor e criatividade. Ela passou a enfrentar o mundo, do seu jeito. E enfrentar para ela sempre foi lembrar de uma inspiração eterna, que mesmo o tempo (por vezes vilão) não apagou… A lembrança da adorada mãe, que sozinha criou seis e mais essa pequenina (traquina), que gostava de observá-la, educando e cuidando de todos, sem distinção ou crueldade, apenas a realidade, exposta a cada um e antes de dormir, as histórias de trancoso, para aguçar ainda mais a curiosidade, enquanto divertia e a fazia esquecer a infância pobre, porém honesta.
E de histórias que existiam e outras nem tanto, a juventude chegou, e com ela, outros dilemas… Fosse no bairro de origem, ou por outros que morou, passou dias, ou até horas, vez por outra tropeçando, caindo, sem saúde, sem chão e ainda assim, a contragosto daqueles mais desumanos, lembrando do quanto é forte, e se reerguendo, ficando de pé, e ensinando, aprendendo, vencendo, se formando… E tendo a noção, desde sempre, que é preciso de alegria, muita alegria (mesmo na dor) para derrotar o cruel inimigo preconceito… Tendo a força da lembrança da mãe, e de todos aqueles que já apoiaram e a acompanham como combustível… E inspirada naquela professora, que um dia mergulhou, sem pestanejar, fazendo ela ver que também poderia resgatar tantos outros meninos e meninas, que a vida tratou de magoar (a vida não, os seres com olhos de desprezo) e que escondidos estão, estes meninos e meninas, à espera, mesmo sem saber, de alguém grandioso como ela, que um dia pode chegar, com uma bolsa carregada de sonhos e um punhado de esperança. E os salvar.
Claucio Ciarlini (2017)
Nota: Maria José Veras Ferreira, mais conhecida como Tia Zezé ou a pequenina gigante deste breve conto inspirado em sua vida, enfrentou preconceitos, obstáculos e pedras no caminho… Superou todos! E é um exemplo para quem já fez parte de sua história (os que possuem coração). Nasceu em 10 de abril de 1965, é parnaibana e residiu boa parte de sua vida no Bairro São José, tendo morado também em outros lugares e hoje no Bairro Pindorama. É graduada em Pedagogia e especialista em Educação Infantil, tendo atuado em várias escolas e faculdades (tanto públicas, como particulares) sempre com o mesmo empenho e entrega, a citar o Colégio Nossa Senhora das Graças, onde lecionou por 25 anos. É referência na área de educação e cultura de Parnaíba, também é poetisa, roteirista, escreveu e dirigiu várias peças em escolas. O nome da professora que a resgatou e lhe serviu de inspiração é Ana Teles e o nome de sua mãe: Teresinha de Jesus Pascoal Veras. Os irmãos: Francisca, Socorro, Antônia Maria, Maria Ozanete, Regina Célia e José Carlos. Os filhos: Darcon e Dalila. Sua caminhada pessoal e profissional, que tive o privilégio de conhecer através de nossas conversas (que muito me emocionaram), é uma grande lição de resiliência e de amor à sua cidade e à Educação, numa linda e vibrante trajetória que precisaria de inúmeras páginas… Um livro! E que livro seria… Quem sabe um dia!
Ela foi muito especial pra minha vida uma parte nunca me esquecerei dela, quando cheguei em Parnaíba fui estudar no colégio das irmã porém sofria bullying e ela sempre ficou comigo ela é muito importante pra mim 😍
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