Creed (Rocky Balboa)

Semtulo

Um olhar
Dirigido ao que mais te causou tormentas, dores e perda da fé. Frente ao espelho.

Um grito
De onde nem mais se esperava emergir qualquer tipo de som ou chiado… Lamento.

Uma raiva
Por não ter sido tão forte, de ter brincado com a sorte, de não ter previsto, o impacto.

Uma chance
Para provar que é possível sim, mesmo em meio a tanta descrença, superar a deficiência

Um golpe
Capaz de deixar cambaleante até mesmo o mais ordinário dos hipócritas arrogantes e metidos

Uma queda
Ou até duas, três, seis… A fim de te mostrar, que nem sempre é a tua vez. Humildade restituída.

Um conselho
Destes memoráveis, que te fazem crer, que você ainda pode ganhar… Mesmo na surra iminente.

Uma canção
Não ao teu ouvido, mas na tua mente, dizendo que é hora de se tornar mais do que homem. 

Um herói
Que nem sempre vai sorrir, que presenciará o mundo ruir, tantas e tantas vezes, e ainda assim, na fé.

Uma corrida
Mesmo na derrota, que na verdade, só é derrota, quando limitados somos para perceber. O todo.

Claucio Ciarlini (2016)

Leminsky

leminski-cesinha2

Leminsky

Poeta com certeza
Declamado
Profeta das incertezas

Detetive da alma humana
Talvez
Das palavras escolhidamente insanas

Leminsky, polaco incontido
Judoca
Samurai do impermitido

Tempestade poética incansável
Paradoxo
Do rigor – relaxo inexplicável

Professor também quis ser
Lição
Num eterno aprender

Através de obra marginal
Surfou
Uma onda experimental

E de rima e em rima, canção
Gerando
Um mundo e meio de inspiração

Foi completamente tudo sem se achar gigante
Gênio
Parado em frente de nós, neste mesmo instante

Ciarlini
2019

Pensamento não se lê

 

dentista

                Marilu pulou da cama espantada. Diferente dos outros dias que abria os olhos vagarosamente estirava um braço, outro, alongava a coluna, as pernas, abraçava o travesseiro, virava para direita, para esquerda, até que com pouca coragem ficava em pé.

                Mas hoje tinha hora marcada no dentista. Gostava de ser pontual. Portanto, levantou-se rápido e  caiu em baixo da água morna do chuveiro, que lhe massageava as costas, o rosto, dando –lhe um agradável bom – dia.

                Chato esse negócio de dentista. Ficar com a boca escancarada com 28 dentes que podem precisar obturar. E quem tem todos os terceiros molares são 32 oportunidades de adquirir cárie. Mas, temos que zelar pelo visual. Fazer o quê? Pior é ficar banguela….e como o Brasil está cheio deles! Salário apertado…dinheiro curto.Para a maioria o dinheiro mal dá para comer e sem mastigar. Falta dente.

                  Marilu fez a higiene da boca. Passou fio dental. Escovou para direita, para esquerda, para cima e para baixo. Bochechou depois se vestiu e saiu para seu destino.

                  Adentrando na sala de espera do consultório conferiu o relógio. Estava exatamente na hora marcada. Nove horas. Sentou-se em frente de um jovem rapaz, bem vestido que lia uma revista. Pensou com seus botões:

                  – Será que ele vai entrar na minha frente? Eu tenho hora marcada.

                   Ele por sua vez observava Marilu e pensava consigo mesmo.

                   – Que moça do olhar bonito.

                    – Ele deve ser advogado. Usando terno, mas não é por isso que vai tomar meu lugar.

                  Marilu estranhava a demora. A atendente não aparecera. Resolveu ler um livro que estava em sua bolsa. Comédias da Vida Privada, de Fernando Veríssimo. Cada crônica interessante. E deixava escapar um sorriso entre uma e outra leitura.

                       De lá ele observava:

– Que sorriso cativante!

Enquanto isso Marilu pensava:

– Está me olhando muito. Pensa que vai passar na minha frente. Cara de pau acha que só ele tem o que fazer. Não cedo.

E ele continuava olhando para ela.

– Vou  puxar uma conversa. Mas o que devo dizer?

E ela:

– Tem cara de Mauricinho. Filho de papai mal acostumado. Pensa que pode comprar todo mundo. Ele que marque hora e espere sua vez.

Ele:

– Tenho que sair daqui com o telefone dessa gata. Como me agradou! Sou capaz de passar o dia inteiro aqui olhando para ela.

A porta abriu. A atendente aparece e diz para Marilu:

                    – Liguei para sua casa para dizer que sua consulta ia atrasar. A senhora já tinha saído. Pode me dar seu celular para evitar outro transtorno? Aconteceu uma emergência e atrasou tudo. Agora que é ainda a vez desse senhor que tem hora marcada antes da senhora.

                      Antes que Marilu dissesse alguma coisa ele se antecipou:

– Não, não, ela pode entrar na minha frente. Eu espero.

                       Marilu esboçou um sorriso encabulado e sem jeito agradeceu a cortesia do rapaz. E já sentada na cadeira com a boca escancarada, pensava: Meu Deus! Por que aceitei passar na frente do rapaz? Ele foi apenas delicado. Nossa! Vou lhe pedir desculpas na saída. Pensando bem, além de delicado ainda é um gato.

                       Mas para decepção de Marilu, quando chegou na sala  de espera estava vazia. Ele resolver marcar sua hora para outro dia.

                 Em casa não tirava o pensamento do ocorrido. Lamentava ter perdido a oportunidade de ter puxado conversa com alguém tão solicito e educado. Um cavalheiro. Um gentleman. Estava envergonhada de ter feito conclusões absurdas de uma pessoa que estava vendo pela primeira vez. Seu pensamento é interrompido com a chamada do celular. Número desconhecido. Quem será?

                      – Alô

                  –  Desculpa estar te ligando. Sou aquele rapaz do dentista.

– Ah! Você….que surpresa! Como conseguiu meu número?

– Gravei quando deu para atendente. Quer ir ao cinema comigo hoje?

– Claro.

O resto desse romance, só sabe Deus…

Marilu aprendeu. Não julgue ninguém antecipadamente.

 

DO LIVRO HISTÓRIA DE MARILU -2005
MARIA DILMAA PONTE DE BRITO – APAL
CADEIRA 28
PATRONO LÍVIO LOPES CASTELO BRANCO
1ºOCUPANTE HUMBERTO TELES MACHADO DE SOUSA

 

 

Marilu – 30/ março/2005.