Colcha de Retalho

   colcha   Quadradinhos de tecido colado um a outro cuidadosamente. As nuances se combinam. Belo colorido. Da seda à chita. Do xadrez às rosas, das listras as bolas. O verde, o azul, o preto, o amarelo e o vermelho se misturam.

            Colcha de retalho que adorna os leitos, que esquenta o corpo, que aquece a alma. Colei o vermelho num dia alegre de sol. Estava de bem com a vida. O pedacinho de bolinhas grandes e pequenas foi cozido quando a cabeça borbulhava. Os problemas nos cercam no decorrer de cada dia. Listras, estradas infinitas, longo caminho retratada na colcha de retalho fofa, macia e bem tecida.

            Arte, beleza, trabalho das mãos. Linha e tecido se encontram quando a agulha os penetra. Ferindo, furando para tecer uma obra. Tudo tem um preço. As mãos trabalham, os olhos vigiam a cabeça comanda. Um dia após o outro, a rotina. Cortar o tecido, costurar, aumentar a colcha. Ela cresce, mas não fica no tamanho.

            Colcha de retalho. Inacabada. Admirada pelos olhos de quem a vê. Amarrotada no baú, misturada às tiras de panos, as linhas, à tesoura e apesar de tudo bela. Recorte de tecidos sem serventia, retirado do lixo para a arte. A transformação de Lavoisier. Nada se perde.

            A vida é uma colcha de retalho. Custa ficar no seu tamanho.  Mesmo que fique, ela não pode ficar pronta para não acabar a vida. Falta sempre um arremate, um complemento, um adorno. Enfeita-se com contas, bordam-se os quadrados, engoma – se, alarga-se. Ela está sempre em produção. Cada um tem a colcha de retalho que merece. Bonita ou feia, forte ou frágil, aquecedora ou aconchegante, construída, elaborada, costurada ponto a ponto, passo a passo nas manhãs, nas tardes e nas noites.

            Colcha de retalho, pedaços de tristezas, de alegria, combinação de paz com amor, quadradinhos de amizades e desamor, recortes de amigos, presença da saudade. Combinação perfeita, obra inacabada, arte, é assim a nossa vida. Uma colcha de retalho.

Maria Dilma Ponte de Brito
Do livro Lero Lero
Cadeira 28 da APAL

 

Deixe um comentário

Preencha os seus dados abaixo ou clique em um ícone para log in:

Logo do WordPress.com

Você está comentando utilizando sua conta WordPress.com. Sair /  Alterar )

Foto do Facebook

Você está comentando utilizando sua conta Facebook. Sair /  Alterar )

Conectando a %s