EU SOU ELA, ELA SOU EU

EU SOU ELA E ELA SOU EU
Wilton Porto

Tantas vezes, vi-te, ó mãe, assim:
Olhos pregados ao teto.
Pensamentos elevando-se aos céus –
Buscavas um encontro com Deus.

Ali – famintos –, esperávamos uma solução…
A barriga não pensava,
A ideia é única: quero comer!

Corre ali, corre acolá!
Expressão condoída no rosto,
Surge – como luz – numa noite escura.
Com vasilhame na mão,
Deixa-nos embriagar com o cheiro da carne em caldo grosso.
Em alvoroço, um a um – dez bocas –
Vamos saciando os desejos do corpo,
Que silente, se aquieta ante a face iluminada de minha mãe.

O perfume vem da cozinha.
Ele desperta-me como se fosse um beijo da amada.
Sem que eu perceba, a fila está montada:
Todos querem o tacho melado de doce de leite.

Minha mãe – doce administradora de doces –
Vai satisfazendo-nos a todos
E o brilho nos olhos dela é plena oração.

Agora, ela está à máquina de costura.
O som que esta emite,
Atravessa os sonhos dos meus antepassados.
Sinto vontade de ser Anjo
Para estar aos pés de Jesus.
Levanto-me determinado!
Pego de meu alforje e despeço-me entre lágrimas.

Barreiras tantas, estrelas muitas.

Hoje, volto. Quantas rugas na minha mãe!
Quanta serenidade e vibração de amor!
O tempo, as dificuldades, as doenças, as tempestades,
Não lhe roubaram o arroubo, o ritmo, a lucidez!…
Beijo-lhe os pés castigados pelo tempo,
Pelos 88 passos dados na trajetória de vida.

Choro de felicidade!

É que ao transformar-me em Anjo,
Num desses momentos de arrebatamento,
Ajoelhei-me aos Pés de Cristo.
Roguei-lhe a favor de Sebastiana Porto, minha mãe.
Contudo, Cristo fora incisivo:
“Por que pedes por ela, se Eu Sou ela e ela Sou eu?!

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