JAIME DA PAZ, UM VARÃO DE PLUTARCO

tenjaimeten-jaimedapaz039

JAIME DA PAZ, UM VARÃO DE PLUTARCO

Elmar Carvalho

Nasceu no lugar São Domingos, zona rural de Campo Maior, em 22 de abril de 1922. De uma prole de onze irmãos, da qual era o antepenúltimo. Filho de José Gregório da Paz e Francisca de Sousa Frota. Aos seis anos de idade já era órfão de pai e mãe, quando passou a morar com seus pais adotivos: José de Deus e Silva (Cazeba) e Cândida Paz (Sicândida), sua tia.

Concluiu o primário no Grupo Escolar Valdivino Tito. Teve como primeira professora Mulata Lima que (juntamente com as suas irmãs) relevantes serviços prestou à Educação em Campo, sobretudo como professora do Ginásio Santo Antônio e de seu estabelecimento particular, denominado Escola Maria Auxiliadora, que funcionava em seu casarão residencial.

Aos dezoito anos, foi morar em Fortaleza, onde estudou e trabalhou. Na capital alencarina chegou a fazer o primeiro ano de contabilidade. Em 1942, com a 2ª Guerra Mundial no auge, foi convocado para integrar a Força Expedicionária Brasileira, quando teve a oportunidade, como Sargento, de fazer um curso na Escola Técnica de Aviação, em São Paulo.

Ao terminar esse curso, foi servir como técnico na 2ª Companhia Especial de Manutenção, no Rio de Janeiro. Nessa capital terminou o curso de Contador, pela Escola Superior de Comércio do Rio de Janeiro. Licenciou-se, a pedido, das fileiras do Exército no posto de 2º Tenente. Em 1948 regressou a Campo Maior, onde passou a lecionar Contabilidade no Ginásio Santo Antônio, do qual foi um dos fundadores o pároco Mateus Cortez Rufino, um dos notáveis beneméritos de Campo Maior.

Em sua terra natal, fundou um comércio de miudezas, tecidos e compra de gêneros de exportação, inicialmente estabelecido na casa de seus pais adotivos. Essa firma veio a prosperar e se tornou uma das mais importantes de Campo Maior, inclusive com a sua instalação em digno e assobradado prédio próprio, situado perto do Grupo Escolar Valdivino Tito, no centro comercial da velha urbe.

Talvez a sua precoce orfandade e a necessidade de começar a trabalhar ainda bem jovem, bem como o seu posterior ingresso no Exército, em que a hierarquia e o respeito à ordem são preponderantes, tenham contribuído para moldar o seu caráter e a sua personalidade. Foi um homem votado ao dever e ao cumprimento de suas obrigações funcionais e compromissos. Certamente a sua experiência militar e a da criação e administração de sua firma comercial contribuíram para que ele viesse a ser um eficaz gestor de seu município natal.

Apesar de seu semblante quase sempre sério (mas não carrancudo), era um cidadão afável, cordato, um perfeito cavalheiro no trato com todas as pessoas, sempre respeitoso e educado. Pelos depoimentos que ouvi ao longo de minha vida, gostava de cumprir o que prometia. Por isso mesmo, não obstante haver sido político, primava em cumprir as suas promessas, e por esse motivo não as fazia de forma leviana, nem eleitoreira. Com efeito, prometia apenas o que tinha a intenção de cumprir e realizar, tanto em sua vida particular, como nos cargos e encargos que exerceu, tais como venerável de sua loja maçônica e dirigente do Rotary.

Campo Maior, no período que vai de 1967 a 1977, teve uma sequência de três paradigmáticos prefeitos: Raimundo Nonato Andrade (Professor Raimundinho Andrade), Jaime da Paz e Dácio Bona. O primeiro, hoje, dá seu nome ao Colégio Estadual, em que fiz o terceiro e quarto ano do antigo curso ginasial; o terceiro foi meu professor de Ciências no primeiro ano desse curso e o segundo (Jaime), juntamente com sua esposa, a professora Mariema, participou de alguns eventos culturais de que fiz parte, quando tive o ensejo de lhe reconhecer a profícua administração de nosso município. Dele e de sua consorte recebi o incentivo e o aplauso sincero e entusiasmado em minha vocação literária. Meu pai, quando a ocasião era propícia, não se cansava de exaltar essas três emblemáticas gestões municipais.

Eu e minha família morávamos ainda em Campo Maior quando o Tenente Jaime assumiu a sua administração. Numa época de poucos recursos financeiros, em que escassas verbas eram repassadas pelo Estado do Piauí e pela União, em seu curto governo de apenas dois anos (1971 a 1973), realizou uma administração exemplar, diria mesmo excelente.

Tendo eu, ainda em plena adolescência, acompanhado o seu governo, e sendo, portanto, testemunha ocular de muitas de suas obras na cidade, tenho dado o meu testemunho de sua probidade e eficiência administrativa. Aliás, o dever da eficiência, embora pouco observado pelos gestores atuais, é previsto em nossa Carta Magna.

Segundo informação da professora da Universidade Federal do Piauí, Sílvia Melo, autora do importante livro “Educação e Educadores de Campo Maior”, “a zona rural foi muito beneficiada [na gestão de Jaime da Paz], destacando-se a implantação de 17 (dezessete) Escolas Rurais e diversos Postos do Movimento Brasileiro de Alfabetização de Adultos – MOBRAL que teve grande importância para reverter o elevado índice existente de adultos analfabetos”. Sem dúvida isso se deveu a seu senso de justiça e sensibilidade, e ao conhecimento que tinha do estado de quase abandono em que viviam os rurícolas na época.

Reginaldo Gonçalves de Lima, de saudosa memória, nascido em Jaboatão dos Guararapes (PE), mas campomaiorense como os que mais o sejam, inclusive por título de cidadania, pelos relevantes serviços que prestou ao nosso município, em suas funções públicas, mas sobretudo no resgate de sua rica história cultural e administrativa, no seu notável livro “Geração Campo Maior – anotações para uma enciclopédia”, que tive a honra e a satisfação de apresentar, disse sobre o governo de Jaime da Paz:

Destaques em sua administração:

Construção do mercado público, inaugurado em 07-09-1972, localizado na Av. Demerval Lobão, e o início da construção do Terminal Rodoviário Zezé Paz. Concluiu e inaugurou o cemitério do bairro São João. Construiu o edifício comercial Prof. Raimundinho Andrade, na Av. Demerval Lobão e casas populares (…).

Tendo se convertido à religião de sua esposa, a professora Mariema (da estirpe Nogueira Paranaguá, irmã de dona Magnólia, falecida esposa do professor R. N. Monteiro de Santana, que também foi prefeito de Campo Maior), passou a frequentar os cultos da Igreja Batista de Campo Maior. Os dois conseguiram formar uma bela família, em que predomina o amor a Deus, a Jesus Cristo e ao nosso semelhante. Sem demagogia e muito menos hipocrisia de falsa caridade (até porque só exerceu o cargo de prefeito em apenas um mandato), mas por sincero amor fraterno, nas comemorações de seu aniversário, convidava pessoas humildes, que, além das iguarias degustadas, recebiam presentes.

Das pessoas proeminentes de Campo Maior, foi um dos primeiros a morar na orla do belo e pequeno Açude Grande, no qual se reflete, quando as águas estão serenas, a silhueta de nossa Serra Azul, também chamada Serra Grande ou Serra de Santo Antônio, sobre o qual tive a oportunidade de dizer:

Açude Grande

apenas no nome, mas pequeno

na paisagem ampla dos descampados.

Tuas águas cinzentas

azularam-se em minha saudade.

Tuas águas barrentas

são tingidas de azul pelo

azul do céu que se espelha

em tuas águas de chumbo.

Como eu dizia, o Tenente Jaime da Paz, há muitos anos, construiu uma bela vivenda, à margem do açude, com largos alpendres e vasto quintal, no qual plantou inúmeros coqueiros e outras fruteiras. Em sua entrada foi afixada a data 11 de julho, que lhe serve de nome. Foi nesse dia, no ano de 1954, que o tenente Jaime e a professora Mariema se conheceram. Essa data é como se fosse um símbolo ou emblema desse amor perene. Entre o muro da vivenda e o açude, no qual banhei muitas vezes, quando ele não era poluído, existia um belo campinho de futebol, de fina e branca areia, quase uma praia, no qual joguei em minha adolescência, como ressalto neste trecho de meu livro “O Pé e a Bola”:

Havia uma praia, no início da década de 1970, de brancas e finas areias, à margem do pequenino Açude Grande, em que tomávamos deliciosos banhos, pois este ainda não fora profanado pela poluição, nas proximidades da casa do tenente Jaime, cujo quintal era cheio de graciosos, elegantes e ondulantes coqueiros, cujo conjunto me dá hoje a impressão de uma pequena nesga de paisagem arrancada do Caribe.

(…)

Nesse tempo o açude possuía, nas imediações da casa do tenente Jaime da Paz, em cujo quintal se erguiam e oscilavam e dançavam verdejantes coqueiros, que mais evocavam uma paisagem marinha, uma bela praia, de areias brancas, finíssimas, onde, na posição de goleiro, fiz ótimas e acrobáticas defesas, a planar, quase levitando, em verdadeiros saltos ornamentais.

Após a construção da avenida de contorno do açude, esse campinho-praia desapareceu, ficando em minha memória, para sempre, a lembrança desse tempo ditoso. Na proximidade da vivenda, como um pontual alargamento do logradouro, o tenente construiu um pequeno recanto florido e ajardinado, bem perto das águas plúmbeas, de onde certamente vislumbrava a beleza da laguna, o voo majestoso e esbranquiçado das garças, as aves aquáticas e a graciosidade distante da serra encantada.

Nesses momentos contemplativos, sem dúvida ele pensava em sua vida bem construída, sem vaidades e sem ostentações, de suas lutas em prol do bem comum e do próximo, sobretudo dos mais humildes. E viu que tudo valeu pena, até porque, parafraseando Fernando Pessoa, a sua alma não era pequena. Teve a alegria de ter todos os seus seis filhos, três homens e três mulheres, formados em curso superior. Fiz amizade com o Gregório, um dos diretores da CEPISA, hoje Eletrobras/Piauí, e o Jaime Filho, engenheiro da Comdepi. Vários de seus netos também são graduados, a maioria em medicina. Portanto, foi um vencedor, no bom e legítimo sentido da palavra.

Se a nossa Campo Maior tivesse o seu Plutarco, certamente no panteão de suas ilustres “Vidas Paralelas”, Jaime da Paz seria um dos mais eminentes varões plutarquianos.

 

RITA PORTELA – Um Coração Magnânimo!

 

 

Texto de Antonio Gallas

Há exatamente uma semana ela partia para o além deixando em todos nós uma dor, uma tristeza, uma grande saudade…

As pessoas costumam dizer que “quem quiser ser bom que morra”! Mas na verdade, não é bem assim. Há pessoas que nascem, crescem, vivem e morrem com a bondade no coração. Essas pessoas jamais saem de nossas mentes, de nosso convívio, mesmo depois de se mudarem para o paraíso.

É o caso de minha amiga Rita de Cássia Nóbrega Portela, a Rita Portela, ou, a Ritinha como comumente a chamávamos.

Nasceu, cresceu, viveu e morreu com a bondade em seu coração.

Minha amizade com a Rita começou tão logo cheguei a Parnaíba e perdurará para sempre, eternamente…

Lembro-me muito bem como se fosse hoje, quando esta amizade começou. Foi numa tarde de Março do ano de 1972 no Ginásio Clóvis Salgado.

Por recomendação da professora Elza Maria Marques Costa, diretora da Escola Comercial de Parnaíba à época, onde consegui meu primeiro emprego como professor de inglês em Parnaíba, fui ao Ginásio Clóvis Salgado falar com a professora Maria da Penha Fonte e Silva, então diretora do educandário, para tentar conseguir uma vaga naquele conceituado estabelecimento de ensino da cidade. A resposta da ilustre mestra parnaibana foi negativa, afirmando que o ginásio já contava com dois professores de inglês, catedráticos.

Não fiquei desiludido com a resposta NÃO, uma vez que estava recém-chegado na cidade e ainda não era conhecido profissionalmente. Entretanto antes de deixar o prédio do colégio, uma pessoinha simpática com um largo sorriso estampado no rosto, sentada a uma mesa na secretaria da escola chamou-me e disse o seguinte: – “professor, eu também sou professora de inglês aqui. Tenho quatro turmas de primeira série (hoje corresponde ao sexto ano do ensino fundamental). Vou lhe dar as minhas turmas”.

Fiquei surpreso, meio encabulado, mas ao mesmo tempo feliz! E passei então a me perguntar: como, neste mundo cheio de pessoas egoístas, alguém poderia abdicar de algo que lhe renderia um salário mensal em favor de uma pessoa desconhecida?

Daí então pude avaliar quão magnânimo, quão bondoso era o coração da Rita Portela. Presentes a esta sua atitude estavam a Salete Menezes e a Toinha que trabalhavam na secretaria e mais duas outras pessoas que não recordo agora quem eram.

Trabalhei no Clóvis Salgado até dezembro de 1982 quando então me desliguei para em janeiro de 1983 assumir um cargo na carreira administrativa do Banco do Brasil na cidade maranhense de Barreirinhas localizada nos “Lençóis Maranhenses”.

A Rita foi uma dessas pessoas que sabia cativar os amigos. Soube viver a vida, intensamente. Sempre com alegria! Bebeu, sorriu, dançou, amou, nos abraçou, nos beijou e sempre trazendo uma mensagem de paz, de carinho, de conforto, de positividade… Não teve filhos, mas criou a Ana Paula e os dois filhos desta, dando-lhes aconchego, conforto, educação e carinho como se fossem seus próprios filhos. Mais uma prova de seu coração bondoso.

Na tarde do dia 17 de fevereiro de 2018 recebemos a triste notícia de que nossa amiga havia partido para o encontro com Deus. Foi para a morada que o PAI havia preparado para ela. Ficamos tristes, choramos, mas temos certeza de que por tudo que ela fez de bem aqui nesta terra ela está feliz, na casa de Deus.

Rita foi sepultada na manhã de domingo, dia 18, no Cemitério da Igualdade com um grande acompanhamento.

Embora tristes pelo seu falecimento, a Rita, durante o seu velório, ainda nos proporcionou o prazer de reencontrarmos colegas que há muito não nos víamos, como a professora Luzia Margarida e outros, assim como ex-alunos como o grupo da turma concludentes do ginásio do ano de 1977 que recentemente, juntamente com ela comemoraram festivamente os 40 anos dessa formatura.

Mais uma prova da sua grandeza! DESCANSE EM PAZ AMIGA!

Rita Portela com alunos que concluíram o ginásio no ano de 1977.

Alguns momentos na comemoração realizada em novembro do ano passado:

Ao fundo em pé Helder Fontenele, Sérgio Cajubá, Crisóstomo, professora Vicença (atual diretora do Ginásio Clóvis Salgado), Rosangela, Tânia e Edilson.
Sentados: Rita Portela e Cid Miranda (hoje professor de inglês em Fortaleza – CE)

 

Outro momento das comemorações dos  40 anos  da turma de  concludentes do Ginásio Clóvis Salgado em  1977.

 

Dona Antonia do Acácio e Minha Formação.

 

farinha

 

Logo no inicio dessa semana que finda a morte andou dando um passeio muito próximo de nossa família. Quando a gente chega numa certa idade já pouco causa surpresa a visita entre nós dessa indesejada e traiçoeira, principalmente se aquela pessoa de nossa estima ou proximidade de parentesco se encontre em leito e doente. Foi o caso de dona Antonia.

farinhada1

Minha mãe a chamava Antonia do Acácio porque foi casada por pouco tempo com seu primeiro irmão e com quem teve três filhos, hoje todos beirando os setenta anos. Meu irmão mais velho, o Cariri e minha irmã Maria do Socorro eram seus compadres, padrinhos de dois filhos dela com seu Zé Martins, seu segundo marido e que lhe deu sete filhos.

farinhada3

Largada de meu tio, que foi embora pro Rio de Janeiro e nunca mais deu notícias, naqueles anos após a Segunda Guerra, com três filhos pequenos pra criar, se juntou com um homem que tinha outra família, seu Zé Martins e com ele depois de alguns anos entrou de Maranhão adentro, no São Paulo, região de Araioses, fronteira com a Barra do Longá, Buriti dos Lopes, indo morar numas chamadas sobras de terra pertencentes a um homem metido a rico da Parnaíba, o Tomás Neto.

farinhada2

Dona Antonia, mesmo tendo motivos por ter sido abandonada por meu tio e com três filhos pequenos nunca deixou ficou diferente ou intrigada com minha mãe. Muito pelo contrário. Já vivendo no São Paulo e com os filhos em idade de mandar pra escola vinha pedir ajuda à cunhadinha, pra que uma de suas filhas, Rosalina, estudasse e morasse em nossa casa por algum tempo enquanto ela se arrumava pra vir viver e botar  os outros na escola em Parnaíba. E sempre foi recebida em nossa casa com grande alegria.

Nas nossas férias da escola primária, eu, Zezinho e Jesus íamos pro São Paulo passar alguns dias naquele interior distante e tão pobre de um tudo, onde não havia qualquer sinal de conforto. Mas foi numa dessas férias que aconteceu um dos fatos mais engraçados comigo e que até hoje conto em casa.

Numa Semana Santa do distante 1969 fui sozinho passar uns três dias na casa de dona Antonia e de seu Zé no São Paulo. Conheceria pela primeira vez uma farinhada. Chegamos numa sexta-feira ao cair da tarde e já no dia seguinte, sábado, seria a vez de conhecer toda aquela arrumação na casa de seu Paulo Zebra.

farinha1

A casa de taipa e coberta de palha de carnaúba, pouco ou quase nenhum conforto da cidade, com todas aquelas crianças, humildes, cerimoniosas com aquele menino de cidade grande, foi pra mim motivo de muita admiração. Interessante é que não tinha portas! Apenas armações feitas de talos grossos de uma palmeira, que à noite eram colocadas na cozinha e na porta da frente. Dona Antonia e seu Zé tinham três jumentos, os jipes pra qualquer tempo, hora e lugar.

Numa dessas noites, com saudade de casa, demorei a pegar no sono. E como quase todo menino de meu tempo, tinha medo de alma e chupava o dedo polegar. Lá pelas tantas senti que alguma coisa muito grande estava muito perto de minha rede. Caí na besteira de, mesmo no escuro, apurar a vista. E não é que erra um jumento?! Alguém de casa, um dos meninos talvez, não teve o cuidado suficiente e deixou de colocar a dita improvisação de porta no seu devido lugar. O animal procurando um abrigo entrou e veio se acomodar justo perto de mim!

fadulzinho2

Mas dona Antonia gostava de ler. Quando vinha resolver alguma coisa em Parnaíba pedia pra minhas irmãs revistas de fotonovelas. Era pra quando desse uma folga no trabalho de casa correr os olhos naquelas maravilhas da literatura depois de ouvir novelas num rádio Semp.  Menino curioso nascido na cidade, já na escola e tirando boas notas, encontrei justo numa tarde do domingo, véspera de minha volta pra casa entre objetos esquecidos, um livro que me foi determinante até hoje, Minha Formação, de Joaquim Nabuco.

 

“Georgina”, de Luiza Amélia, ganha reedição.

 

georgina1

A literatura piauiense tem motivos de sobra para comemorar, afinal, depois de 125 anos, Georgina ou os efeitos do amor, obra máxima da poetisa piauiense Luiza Amélia de Queiroz, foi reeditada e virá a público nas próximas semanas, em Teresina. Os créditos recaem para a equipe do Núcleo de Estudos de Literatura Piauiense (NELIPI), vinculado à Universidade Estadual do Piauí e coordenado pela professora doutora Algemira de Macêdo Mendes.

A reedição, que conta com a organização e a apresentação do parnaibano Daniel Castello Branco Ciarlini e Algemira de Macêdo Mendes, e texto de orelha de Rosana Cássia Kamita, importante nome nos estudos de literatura e gênero do Brasil (UFSC), é um dos mais ousados empreendimentos de resgate das letras piauienses nos últimos tempos.

georgina2

Dividida em cinco cantos que somam mais de 3 mil versos polimétricos, Georgina é, na realidade, uma narrativa em versos, protagonizada por um casal, Acrísio e aquela que dá título à obra. O livro traz ainda um bônus aos leitores: inúmeros outros poemas inéditos da poetisa, publicados no século XIX, quando ela então colaborava para o Almanaque de Lembranças Luso Brasileiro.

casa8

“Georgina, de Luiza Amélia, é de suma importância às letras do Piauí e interessa muitíssimo à historiografia literária de Parnaíba, afinal, foi nessa cidade que a poetisa viveu a maior parte de sua vida e escreveu parte considerável dessa narrativa em versos”, afirmou Daniel Ciarlini, um dos organizadores da reedição.

O projeto gráfico do livro tem a assinatura de Marleide Lins de Albuquerque e ilustração de Jheine A. Cunha.

Luíza Amélia de Queiroz Brandão é patrona da cadeira  24 da Academia Parnaibana de Letras, tendo como atual ocupante o jornalista e escritor Antonio de Pádua Marques Silva. Viveu em Parnaíba tendo morado no imponente sobrado da atual avenida Presidente Vargas. Fonte: Daniel CB Ciarlini. Fotos: web/APM Notícias. Edição: APM Notícias.

DEPOIMENTO SOBRE JOSÉ ELMAR DE MELO CARVALHO

elmar-apl-site

DEPOIMENTO SOBRE JOSÉ ELMAR DE MELO CARVALHO

Alcenor Candeira Filho *

     Já me manifestei por escrito sobre a obra literária de Elmar Carvalho em quatro momentos, todos revestidos de caráter solene e público: 1994, com o discurso de recepção na posse do poeta na Academia Parnaibana de Letras; l996, com a apresentação de ROSA DOS VENTOS GERAIS na noite do lançamento em Parnaíba; 2010, com a apresentação de POEMITOS DA PARNAÍBA no lançamento ocorrido no auditório da APAL; 2015, no lançamento do livro CONFISSÕES DE UM JUIZ.

     Formado em administração de empresas e em direito. Magistrado, jornalista, poeta, cronista, crítico literário e romancista, Elmar é autor de vários livros em prosa e em verso, destacando-se ROSAS DOS VENTOS GERAIS, LIRA DOS CINQUENTANOS, CONFISSÕES DE UM JUIZ e HISTÓRIAS DE ÉVORA.

capa-lira-50

     Durante o tempo em que morou em Parnaíba (1975/1982), Elmar participou de vários movimentos culturais, principalmente como presidente do Diretório Acadêmico 3 de Março (CMRV/UFPI) e membro do Movimento Social e Cultural Inovação.

     Na qualidade de literato, Elmar é mais conhecido como poeta e romancista, mas não podemos deixar de lembrar a sua vocação para a crítica literária.

     Mesmo não sendo ainda autor de livro no gênero, Elmar já publicou em revistas e jornais vários textos de crítica literária, voltados especialmente para a análise de obras piauienses.

     O trabalho que Elmar Carvalho vem realizando se afasta da velha crítica historicista, que realça os elementos extrínsecos (biográfico, histórico e sociológico) da obra literária. Ciente de que literatura é acima de tudo “monumento estético”, o escritor tem optado pela chamada “nova crítica”, que valoriza os elementos intrínsecos da obra. Se literatura é a arte da palavra, o texto e a sua interpretação estético-literária é que importa.

     No início de 2010 Elmar Carvalho criou por sugestão de sua filha Elmara o “poetaelmar.blogspot.com.br”.

     Ao longo desses oito anos de existência, o blogue vem divulgando textos em prosa e em verso de sua autoria e artigos e poemas de intelectuais do Piauí e de outros estados brasileiros.

     Elmar Carvalho tornou-se um dos poetas mais importantes da Geração do Mimeógrafo ou dos Anos 70, geração que escreveu uma poesia agressiva – chamada marginal ou alternativa -, caracterizada por uma linguagem livre e contestatória e fortemente impregnada de denúncia.

     Essa poesia social, reveladora de um grande poeta público, se reveste de acentuado sopro épico, como exemplificam os poemas que integram “A Zona Planetária”, título inspirado num prostíbulo de Campo Maior.

     Além da poesia utilitarista, o poeta tem criado também a poesia lírica como se vê no poema “Marítima”.

capa-325c225aaed-rosa2bdos2bventos2bgerais

                    A mais importante obra poética de Elmar Carvalho – ROSA DOS VENTOS GERAIS -, com três edições, apresenta apreciável diversidade temática, variedade percebida também em termos de gêneros literários, com versos para todas as preferências e gostos: líricos, sociais, épicos, satíricos.

     A partir dessa diversidade, o poeta dividiu a coletânea em quatro partes, que passo a comentar.

      Os poemas da 1ª PARTE são líricos. Falam de amores devastadores, como no “Poema da Mulher Amada”, e de amores idos e vividos, como na “Elegia do Amor Final”.  Aliás, as coisas idas, vividas e revividas predominam na parte inicial do livro.

     O passado não é uma pedra, não é uma campa, por isso nele o poeta mergulha como que em busca do tempo perdido “com seus gemidos/ de fantasmas que/ arrastam correntes/por entre ais doloridos”.

     Conforme está dito em “Eterno Retorno” o passado são “emoções revividas/ e ampliadas/ das sensações/de nervos expostos/ nas carnes pulsantes”. Na esteira da teoria circular, o poeta lembra que “o passado poderoso e renitente/ retorna e continua vívido e presente/ se contorcendo se retorcendo/ e se reacontecendo.

     Já o poema que abre a coletânea – “Autobiografia Zodiacal” – anuncia uma das características marcantes do poeta Elmar Carvalho: sua vinculação com o concretismo, vanguarda que propõe o aproveitamento de recursos espaciais e geométricos como elementos orgânicos do poema.

     A miséria humana, observada numa das regiões mais carentes do país, latejam nos versos que compõem a 2ª PARTE do livro, denominada “Cancioneiro do Fogo”.

     Certamente não são versos incendiários, porque não incitam a rebelião. São versos utilitários, que servem para tornar o ouvido um órgão capaz de ouvir, por exemplo, o ronco sinistro de vísceras famintas:

                                                    “a rosa

                                                    que come

                                                    e consome

                                                    o ‘home’

                                                    mora

                                        em sua víscera sonora

                                                 e o devora

                                        como uma flora

                                                 cancerosa

                                                          rosa carnívora

                                        que aflora e o deflora

                                        de dentro para fora”.

         O poeta, sempre interessado em sua época, assume a posição de receptáculo do sofrimento humano, de caixa acústica por meio da qual as pessoas possam tomar conhecimento dos males que as afligem, como neste minúsculo poema “O Favelado”

                                      O favelado, qual filósofo meditava:

                                      sua miséria era tamanha

                                      que tudo enchia e ainda sobrava”.

     A terceira parte do livro – “Cancioneiro da Terra e da Água” – celebra o Piauí. São versos líricos através dos quais o poeta empreende um passeio sentimental por ruas, praças, praias, campos, casas, catedrais e cidades piauienses. Nesse bloco de composições telúricas, destacam-se, como os mais inspirados e de melhor solução formal, os poemas “Noturno de Oeiras” – resultado de uma viagem física e psicológica que o poeta realizou pelo reino mágico da antiga capital de inúmeras tradições históricas, religiosas e artísticas -, e “Marítima”, escrito no ritmo oceânico do mar, em cujas ondas o poeta assimilou os gestos e o jeito de falar e de ser.

     A vida, respirada, repisada, repensada e/ou reinventada nos ares do Piauí no final do século XX, mas sempre a mesma em qualquer lugar e época, – eis a matéria-prima da poesia reunida na derradeira parte do livro – “Cancioneiro dos Ventos Gerais”.

     A vida em Parnaíba, que o poeta já exaltara em vários poemas inseridos no “Cancioneiro da Terra e da Água´, está presente na série denominada “PoeMitos da Parnaíba”, que retratam tipos curiosos, malucos, miseráveis, humanos.

     Dois poemas se destacam na parte final do livro, ambos de natureza épica na classificação do próprio autor: “Dalilíada”, baseado na vida e na obra do pintor espanhol Salvador Dali, e a “Zona Planetária”, inspirado no cabaré de Campo Maior.

     Num total de 382 versos, distribuídos em 10 segmentos, o poeta focaliza a prostituição através de um processo criativo em que mistura a mitologia clássica, a astronomia e a sociologia dos lupanares.

     O início do poema fornece uma visão geral da promiscuidade do ambiente, onde as emoções são alinhadas pedra a pedra ao som de vitrolas que embala os “que bebem vinho/ e sangue em frágeis taças de cristal”.

      Há versos admiráveis nesse moderno poeta épico, seja pela magia musical, seja pela beleza das imagens. Se a linguagem às vezes ganha sabor classicizante para ajustar-se ao referencial mitológico, assume quase sempre expressividade moderna e contundente, como nos versos de “Marte”, cujo ritmo de rudo açoite parece querer varrer as impurezas da vida instintiva e sublinhar a sublime alvura dos lençóis lavados em lágrimas vertidas nas ressacas das “tempestades do sexo”.

     Com POEMITOS DA PARNAÍBA, obra ilustrada com caricaturas de Gervásio Pires e Castro Neto, Elmar Carvalho revela mais uma faceta de seu talento poético: a produção jocosa, alegre, graciosa, satírica, retratando anatômica e psicologicamente pessoas que foram ou são bastante conhecidas em Parnaíba, a maioria gente humilde.

capa-livro-confissc3b5es2b0012b-2bcopia

     Finalmente, CONFISSÕES DE UM JUIZ é um livro de quase duzentas páginas que reúne parte dos textos postados no blog: crônicas, comentários, reminiscências, confissões, reflexões sobre pessoas, bichos e lugares.

     A obra enfatiza na parte inicial as lembranças do burocrata, sobretudo do julgador, do que tem a responsabilidade superior e constitucional de “atribuir a cada um o que é seu”. Responsabilidade imensa a do juiz, que raramente é reconhecido pelo que faz no desempenho da profissão.

     Destaca-se nas primeiras páginas do livro a revelação, em tom de quase desabafo, feito por quem laborou durante quatro décadas na vida pública e dela teve se afastar em razão de aposentadoria fundamentada em tempo de serviço mas motivada verdadeiramente por razões que a própria razão desconhece.

     O juiz Elmar teria ainda outro argumento para justificar a aposentadoria, se essa fosse o seu objetivo: doença grave.

     Mas no fundo o que ele pretendia apesar dos pesares era continuar servindo ao país como magistrado culto, íntegro, justo, bom. Estava plenamente motivado para o trabalho forense por mais algum tempo.

     O comovente depoimento de Elmar sobre os fatos e circunstâncias que precipitaram o pedido de aposentadoria aos 58 anos de idade repercutiu no meio forense e intelectual, com opiniões postadas na internet e comentários inseridos no livro.

     Na 2ª e 3ª PARTES do livro, o autor selecionou textos escritos há algum tempo, vários deles complementando e elucidando fatos focalizados na parte inicial.

     Recentemente Elmar Carvalho publicou o romance HISTÓRIAS DE ÉVORA, que ainda não li.

     Elmar Carvalho é casado com Maria de Fátima de Sousa Carvalho, com quem tem dois filhos. Pertence a várias agremiações culturais e literárias. Ocupa a cadeira nº 10 da Academia Piauiense de Letras e a de nº 07 da Academia Parnaibana de Letras.

* Escritor e poeta. Membro da APL

capa-h-25c32589vora

APAL trata de convênio com a Fecomércio e lançamento de livro.

 

convenio2

 

O presidente da Academia Parnaibana de Letras, José Luiz de Carvalho, acompanhado do secretário-geral Antonio Gallas Pimentel, esteve na tarde desta sexta-feira dia 16 na Federação do Comércio do Piauí tratando com o presidente Valdeci Cavalcante sobre assuntos relevantes para a entidade.

convenio1

Segundo o presidente José Luiz de Carvalho foi marcada a data de lançamento do livro Eixo do Tempo, de Alarico da Cunha, às 19h, no dia 23 de março no SESC Avenida e cuja renda será revertida para a Academia Parnaibana de Letras.

Também foi tratado o convênio entre a APAL e o SESC. Valdeci Cavalcante, empresário, advogado e escritor, toma posse na cadeira 39, que tem como patrono seu pai, o comerciante e ex-vereador Gerardo Ponte Cavalcante, no dia 13 de abril no Espaço de Eventos, bairro de Fátima. Fonte: APAL. Fotos: APAL/SESC. Edição: APM Notícias.

Braga Tepi - Artista Plástico - 2011

O TALENTO ESCULTÓRICO DE BRAGA TEPI

Elmar Carvalho

Hoje à tarde fui acordado de um cochilo por um recado de meu irmão César Carvalho, que me mandava entregar um álbum com fotografias coloridas de esculturas de Braga Tepi, que foi convidado a expor suas obras na H. Rocha Galeria de Arte, no Rio de Janeiro. A exposição será aberta no próximo dia 04 de março e se estenderá até o dia 23 do mês seguinte.

Confesso que ainda não ouvira falar nesse artista, e, portanto, não conhecia seus trabalhos. Por isso mesmo, olhei o fólio lentamente, com muita atenção. Surpreendi-me com a qualidade das peças. São obras construídas com sucatas de ferro. Mas nota-se que o artista teve muito cuidado na escolha das peças e no modo como as interligou, como as encaixou e dispôs, dando harmonia ao conjunto.

Mesmo nas esculturas grandes e pesadas, pode ser visto, em certas partes da composição, um toque detalhista, uma minúcia de obra minimalista, como se fora um trabalho de delicada ourivesaria, fazendo como que um contraste com as partes maiores e mais compactas. Apenas pelo título de algumas obras, que remete à cultura humanística e clássica, percebe-se que Braga Tepi não é um artesão ingênuo, e muito menos primitivista.

Dentro do que é possível nesse tipo de escultura, concebida com a montagem das mais diferentes peças de sucatas de ferro, que não permite uma moldagem total, pode-se afirmar que ele é um figurativista de alta linhagem, mas sem ser um copiador servil e fotográfico da natureza, porque sabe distorcê-la artisticamente, adicionando elementos colhidos na imaginação, na mitologia, nos sonhos, podendo-se tirar a conclusão de que ele agrega a algumas de suas esculturas, com muito refinamento e graça, elementos extraídos do surrealismo.

Sem dúvida, pelo que pude perceber das peças constantes do álbum, é um dos maiores escultores do Piauí, e inegavelmente é um dos grandes artistas brasileiros. Por isso, não me chateei de ter o meu cochilo sido interrompido abruptamente. Até porque mergulhei num sonho maior e melhor, que é a arte mágica, supra e surreal de Braga Tepi.

12 de fevereiro de 2010

Sucesso literário.

 

sucessoliterario2

Ao falar do escritor escocês Walter Scott, e mais detidamente do flamengo Hendrock Conscience, Otto Maria Carpeaux, num dos raros momentos de posição em sua História da literatura ocidental, deixou entrever o seguinte juízo: “Não existe relação entre os valores literários e os efeitos sociais: o sucesso não é prova de valor; a mediocridade não exclui consequências benéficas” 1. Esse pensamento depõe contra o senso comum que acredita o sucesso literário edificar um nome no disputado mundo das letras.

sucessoliterario3

Mais do que isso, a fala de Carpeaux esconde algumas verdades que rondam as letras pelo menos desde Voltaire, que num arroubo de autoafirmação costumava escrever nos jornais sobre si e as suas próprias obras ou fazia com que os outros escrevessem, elogiando-o (as), numa espécie de marketing pessoal que ainda perdura – hoje avolumado por “campanhas” que se espalham em redes sociais motivadas por noviços escritores, marqueteiros em sua essência.

sucessoliterario4

Em “Conselho aos jovens escritores”, Baudelaire infere que “o sucesso é, numa proporção aritmética ou geométrica, a consequência da força do escritor, o resultado dos sucessos anteriores, frequentemente invisíveis a olho nu” 2. Essa força e esses esforços de que fala o grande nome da poesia francesa não se relacionam a campanhas em nome próprio, mas ao brio estético com que o verdadeiro escritor se depara ao longo da vida.

sucessoliterario5

À dedicação diuturna pela forma ideal, que o obriga muitas vezes a vencer as limitações receptivas de um tempo, rompendo com as expectativas de um público afeito e viciado a modelos pré-definidos; eis aqui o grande esforço: ser propositor ao invés de reprodutor. Se esses sucessos são invisíveis a olho nu é porque nem sempre eles virão em tempo hodierno, mas depois que, vencidas as limitações de leitura, uma dada geração ser capaz de absorver o bem simbólico produzido.

sucessoliterario6

Obra medíocre, portanto, é aquela que se furta em exigir de outrem uma meditação ou, no mínimo, uma leitura mais profunda, antes cumpre apenas o papel de apreensão imediata, da ordem do dia, dando ao público exatamente as imagens superficiais que ele se identifica – como o é a maior parte dos best-sellers, que não excluem “consequências benéficas” aos seus criadores. Esse valor de mercado, como indica Bourdieu, é inversamente proporcional ao valor literário, traduzido por Flaubert como aquele que quanto mais consciência se põe no trabalho menos proveito pecuniário se tira dele.

Isso porque novos códigos exigem novos leitores, que só se formam a médio e a longo prazos, daí porque os lucros que dele se tiram são os mais duradouros e mais alicerçados na história das letras, já que não flutuantes e nunca efêmeros como a moda do dia. Não por acaso se atribui ao tempo o grande juízo dos fatos. O que é bom permanece, o que é ruim é esquecido.

A história nos indica que pouquíssimos foram os escritores que alcançaram o sucesso em vida, e mesmo esses, quando o conquistaram, já estavam nas últimas primaveras de vida, como os recentes casos de Gabriel García Márquez e José Saramago, que agradavam tanto ao público comum como aos leitores mais competentes.

sucessoliterario7

Ainda não vivi o tempo necessário para dizer que acumulei experiência produtiva de vida, todavia, no abreviado tempo que já passou, vi sujeitos começarem nas letras muito bem, conquistarem algum espaço e depois, convencidos de sua pretensa “genialidade”, tropeçarem no próprio orgulho, no exibicionismo precoce e na prepotência – características que foram inevitavelmente transplantadas à produção, que muito perdeu em riqueza e polissemia.

Esses mesmos sujeitos são aqueles que formaram em torno de si capelinhas de elogio, e porque se puseram a crer em julgamentos de amizade, perderam o senso crítico real sobre os próprios trabalhos e, no que tange aos ganhos artísticos (que são diferentes desse capital social pernicioso), o que um dia estava em ascensão repousa na mais infame horizontalidade.

Medir a projeção de uma obra não é sondar e ter na ponta do lápis todos aqueles que a celebram e a leem, porque esses são os amiguinhos de plantão que a contemplam não pelo objeto, mas pela inescapável cordialidade de todos os dias. O verdadeiro ganho de um autor contraditoriamente dilui-se pelos dedos, constituído por um público discreto que aprecia mudo e sequer o conhece, senão através do escrito. Os livros quando produzidos e distribuídos não nascem para serem sondados, mas para os espaços jamais imagináveis e as prateleiras dos mais exigentes leitores.

Teresina, 2 de novembro de 2017.

Daniel C. B. Ciarlini.

 

NOTA DE PESAR E CONVITE MISSA

ACADEMIA PARNAIBANA DE LETRAS – APAL

 

O Presidente José Luiz de Carvalho, representando os demais membros da APAL, lamenta profundamente o falecimento do acadêmico José Alves Fortes Filho, falecido em Teresina no dia 11 do corrente mês, domingo passado. José Fortes, como era conhecido nos meios jornalísticos e acadêmicos do Piauí, exercia atualmente a presidência da      Academia de Letras da Região de Sete Cidades José – ALERSC.

Em sufrágio de sua alma, haverá uma missa no próximo sábado, dia 17, às 17:h30h, na Igreja de São Sebastião em Parnaíba para a qual convidamos os acadêmicos e demais amigos.

Agradecemos antecipadamente aos que comparecerem a este ato de fé e de solidariedade humana.

O falecimento do Jornalista e Acadêmico José Fortes deixa uma grande lacuna nos meios jornalísticos e intelectuais do Piauí.

 

                                                                      

 

O PIERROT E A COLOMBINA

 

Texto de Antonio Gallas
Este fato aconteceu de verdade  num carnaval  em São Luis do Maranhão envolvendo um casal da alta sociedade ludovicense, à época, início da década de 1970.  Ele, conceituado médico, e ela, a esposa, presidente de um clube beneficente.                          Como se sabe, muita coisa acontece no carnaval. Coisas boas, ruins, tristes, alegres, casais se conhece, se encontram, se reencontram, se unem, se separam… Enfim é carnaval!!!!   Este causo já publiquei outras vezes e faz parte do livro “Meu Sobrinho Prodamor  e Outros Causos” que pretendo reeditá-lo brevemente. E como hoje é o último dia (oficialmente, porque no Brasil o carnaval e a farra dos políticos é o ano inteiro) do período momesco,  achei conveniente republicá-lo. Vamos ao causo:

 

 

 

O PIERRÔ E A COLOMBINA

Antonio Gallas 

pierrot

 

“… no meio da multidão! Pam… paam… pam… pam…! quanto riso, oh! quanta alegria, mais de mil palhaços no salão…”

Bons tempos aqueles em que nos carnavais se cantavam frevos, marchinhas e marchas-rancho…

E foi cantando “Máscara Negra,” composição do imortal Zé Kéti que o Dr. Ariosvaldo adentrou naquele domingo de carnaval num dos mais famosos clubes populares de São Luís – O Bigorrilho.

Os clubes populares fizeram parte da história do carnaval de São Luís do Maranhão nas décadas de sessenta e setenta. Os mais famosos eram Canecão, na Rua do Passeio e Bigorrilho, no Caminho da Boiada. Ali sim, se vivia um verdadeiro carnaval!

Ninguém era de ninguém! Só era permitido brincar fantasiado. De máscara. De fofão, pierrô ou colombina. O lança-perfume não era usado como entorpecente e sim como purificador de ambientes… No final, muitas surpresas. Agradáveis e desagradáveis…

Foi neste clima contagiante do carnaval que o Dr. Ariosvaldo, conceituado médico cirurgião participante dos mais altos eventos sociais da capital maranhense resolveu fantasiar-se de fofão e no anonimato de sua fantasia desfrutar um pouco da liberdade, que por força da profissão, em datas como Natal, Ano Novo e Carnaval, sempre lhe era tolhida, por causa de um plantão noturno.

Naquele domingo não. Aquele domingo seria seu! Queria aproveitar minuto a minuto. Curtir! Desvairar-se! Beber! Desbundar total!

Pediu  então para um estagiário cumprir o seu plantão no Hospital Presidente Dutra, naquele domingo de carnaval. O Hemetério,  seu melhor aluno do curso de medicina da Universidade Federal do Maranhão, já no último ano, poderia tranquilamente dar conta do recado. Afinal ninguém iria ficar sabendo, nem mesmo dona Constância Inocência, sua fidelíssima esposa, dedicada ao lar e ao socorro dos desamparados.

Essa mesma é quem não deveria saber! Nem em sonho…!

Caiu na gandaia, o Dr. Ariosvaldo! Bebeu, sambou, pulou e lá para as tantas se agarrou com uma colombina. Abraços, apalpos, mãos-bobas, sussurros… Beijos só quando tirassem as máscaras…

Resolveram então ir para uma casa de tolerância, ou seja, um rendez-vous (ou vandevu como se chamava popularmente), visto que, nessa época não existiam os motéis.

Aproveitariam a paz e a tranquilidade das quatro paredes para se conhecerem e desfrutarem aquela noite num eterno frenesi com seus corpos flamejantes de amor.

Qual foi a surpresa de Dr. Ariosvaldo quando tirou a máscara de sua colombina e quando esta exclamou:

– És tu Ariosvaldo?!

– É você Inocência?!

Hoje    depois de mais de três décadas do acontecido,  sempre quando chega o carnaval Dr. Ariosvaldo se entristece em saber que num domingo de carnaval foi corno de si próprio. E balançando a cabeça negativamente cantarola baixinho: “… mais de mil palhaços no salão…” ou então vêm à sua memória aqueles versos de Noel Rosa que diz  “um pierrô apaixonado/que vivia só cantando/por causa de uma colombina/ acabou chorando/acabou chorando…”