Minhas senhoras e meus senhores.
Há trinta e três anos incompletos, no dia 28 de julho de 1984 esta Academia Parnaibana de Letras estava comemorando seu primeiro ano de existência quando numa cerimônia igual a esta deu posse a quatro novos membros a professora Edimée Rego Pires de Castro, Fernando Basto Ferraz, Renato Araribóia de Brito Bacellar e Antonio de Pádua Franco Ramos.
Essa cerimônia foi realizada no solar Nova Mocha, casa de morada de José Pinheiro de Carvalho e onde nasceu a academia. Naquela ocasião estava sendo presidida pelo escritor João Nonon Fontes Ibiapina. Por uma dessas coincidências, nesta noite, aqui e agora estão sendo empossados quatro acadêmicos entre eles, este que vos fala e que vai ocupar a cadeira de número vinte e quatro, da professora e poetisa Edimée Rego Pires de Castro.
A Academia Parnaibana de Letras estava como fazem as crianças de um ano de idade, estava iniciando sua vida, se levantando e começava a dar os primeiros passos. Haveria de ao longo dessas mais de três décadas ir muito longe e sendo renovada. Por ela passaram grandes vultos da cultura e das letras do Piauí. Ela ainda é neste início de século, a Meca de muitos e muitos escritores.
Neste maio, mês das mães, reverencio duas mulheres que tiveram influência, brilho e participação nesta casa de letras. Digo mais, que até hoje causam admiração. Dada a limitação do tempo vou privar a todos nesta ocasião das longas biografias domésticas de minha patrona e de minha antecessora. Vou deixar aqui nesta cerimônia pública, registrada minha opinião sobre as suas obras. Creio que isso basta.
Dessa forma, faço um breve passeio pela vida intelectual de Luiza Amélia de Queiroz Brandão e de Edimée Rego Pires de Castro, a parte de suas vidas que as imortalizaram. São nos seus livros de poemas, romances ou outros gêneros que os escritores se materializam depois de mortos. É a forma de nos tornarmos presentes na vida e no tempo das pessoas.
A primeira, Luiza Amélia de Queiroz Brandão, patrona da cadeira 24, poetisa, uma das mais extraordinárias mulheres do seu tempo, tão bem pesquisada na obra A Face oculta da Literatura Piauiense, de Daniel Castelo Branco Ciarlini, obra que tive a honra de comentar na quarta capa, nasceu em Piracuruca em 26 de dezembro de 1838 e faleceu em Parnaíba em 12 de novembro de 1898. Em 1875 escreveu seu primeiro livro, Flores Incultas e o mais que interessante Georgina ou os Efeitos do Amor, de 1893.
Sobre este último trabalho de Luiza Amélia de Queiroz Brandão, de novo vou buscar no excelente livro de Daniel Castelo Branco Ciarlini material para alimentar este discurso sobre a poetisa filha de Piracuruca e parnaibana de coração. Não houve na história da literatura piauiense até a presente data nenhuma obra que se prolongasse tanto em versos românticos e árcades quanto a lira de Luiza Amélia de Queiroz Brandão. Três mil seiscentos e trinta e cinco versos! Numa época em que a sociedade brasileira assistia ao surgimento das primeiras correntes feministas e as mulheres pouco ou quase nenhum acesso tinham às letras!
Agora falo de Edimée Rego Pires de Castro, tão bem aqui representada por sua filha dona Maria e seu genro, doutor Emídio a quem agradeço muito a presença. Fontes Ibiapina, na apresentação do livro Poetizando, disse dela: ora romântica, ora lírica, sempre transborda uma inspiração com muita propriedade arquitetônica em seu pensamento numa formação ético-espiritual. Para mim, dona Edimée a cada minuto de mergulho em sua obra, encontro surpresas. Tem escritos os seguintes livros: Poetizando, 1986; A trova e o espaço piauiense, 1988; Primavera, de 1992;
Dona Edimée Rego Pires de Castro, como era carinhosamente tratada pelos amigos, conhecidos e admiradores, escreveu crônicas, poemas, artigos e até antecipou na literatura da Parnaíba o maravilhoso e exótico haikai ou tanka, o poema japonês. Sem esquecer que usou a poesia para mostrar preocupação com os mais humildes, os desvalidos, as calamidades, o avanço das ciências e a educação. Soube pela poesia, nas crônicas e artigos de opinião demonstrar um amor imenso pela nossa terra.
Soube amar a família e dar a ela destaque em vários trabalhos de sua lavra as homenagens aos netos Ricardo Augusto e Georgina como está no livro Primavera, de 1992. Participante da Organização Aparício Fernandes, escritores do Brasil, entre 1984 e 1986; Poetas do Brasil, 1986; Brasil Trovador, de Laís Costa Velho, 1986. Nasceu em Parnaíba a 13 de fevereiro de 1915 e aqui também faleceu em 09 de novembro de 2011. Sua figura humana, sua obra literária e seu exemplo de mãe, funcionária da Câmara Municipal e de professora a credenciam a ter assento privilegiado no registro da história da Parnaíba.
Minhas senhoras e meus senhores!
Sobre nossa literatura, digo que é uma das mais ricas deste Piauí. A literatura parnaibana, a atual, assim como foi a de Edimée Rego Pires de Castro e Luiza Amélia de Queiroz Brandão, está no seu melhor momento. Pela abertura de oportunidades a todos e a todos os temas e gêneros, presente em livros, revistas e outros meios. Mais importante ainda é que está vindo das camadas sociais mais distantes, da juventude, onde até pouco tempo não se imaginava.
Nossa literatura deve atingir e defender as necessidades do nosso povo. Tem de ser uma peça de comunicação entre esse povo e seus governantes através de elementos alimentadores do debate saudável e civilizado para que a convivência entre todos seja a mais democrática possível. Nossa literatura está nos artigos de opinião, poesias, letras de música, artesanato, textos para o teatro e até nas obras de artes plásticas.
Nossa literatura não pode e nem deve se encastelar no encantamento das nossas belezas naturais ou as do patrimônio arquitetônico de pedra e cal. Nossa literatura, principalmente aquela saída da forja da imprensa agora livre, pode e deve se preocupar com o nosso acervo histórico, o destino, resgate e o registro, mudanças e finalidades. Nossa literatura pode e deve se preocupar com o casamento entre o passado e o presente, presente nas obras de arte, monumentos, praças, repartições públicas, rios, lagoas e outros tantos equipamentos que são ao nosso povo destinado.
A minha geração, a nossa geração, está neste momento ultrapassando a faixa dos sessenta anos de idade. Somos protagonistas e testemunhas de grandes acontecimentos. No mundo, o pós-guerra, no Brasil, do sonho exagerado de Kubistcheck com sua Brasília e mais lá na frente, a ditadura militar.
Em nossa Parnaíba uma geração que teve de ver a decadência de nossa economia, a saída dos jovens em idade de crescimento profissional, a fuga de inteligências para outras regiões mais adiantadas porque aqui não havia de onde se tirar sustento. Hoje os tempos são outros. Nossa geração, senhor presidente, minhas senhoras e meus senhores, não pode se furtar, se esconder e ignorar a difícil realidade do passado e a realidade do presente.
Há necessidade que se façam adaptações de comportamentos, individuais ou coletivos, para que continuemos ativos, ora conduzindo, ora conduzidos. O importante é a participação com a juventude das aspirações e das conquistas. Não podemos pelo isolamento, pela falsa impressão de que sabemos tudo, pela acomodação da idade e da experiência nos afastemos do cotidiano, dos insistentes e necessários palcos da modernidade.
Devemos ser contrários a toda ideia daqueles que dizem que não podemos mais fazer isso ou aquilo. Nós podemos e devemos fazer. E se não podemos nós mesmos fazer deixemos que outros o façam. Vamos seguir em frente! Mesmo que não sejamos mais os líderes, aqueles que puxam o cortejo ou a procissão. Mas vamos seguir caminhando, ao lado da juventude, de mãos dadas e com os mesmos propósitos de horizonte e de porvir que devem ser muito maiores que nossos medos!
Senhor presidente, minhas senhoras e meus senhores.
Estou aqui nesta noite junto a meus amigos. Estou feliz e agradecido. Agradecido pela acolhida do voto daqueles que permitiram minha eleição para esta Academia Parnaibana de Letras. Agradecido pela presença dos que atenderam meu convite para dividirmos esta alegria e felicidade. Chego a esta casa de cultura, cheio de propósitos. Os mesmos que serviram para a criação desta academia em 28 de julho de 1983. Chego a esta casa certo de que a convivência com meus confrades será de muita harmonia, trabalho e busca de resultados. Trabalho semelhante ao das abelhas. Na colmeia todas trabalham. Todas participam.
Que esse nosso trabalho, fecundo, harmonioso e constante seja de uma profundidade muito grande para que as gerações que nos sucederem possam se orgulhar do nosso tempo. Já se passam dezessete anos do século XXI. As mudanças sociais nos empurram pra frente. Nossa idade, na nossa idade, quando muitos acreditam e apregoam não terem mais o que aprender ou ensinar, eu continuo acreditando que se pararmos e não procurarmos seguir e manter o passo haveremos de em pouco tempo sermos colocados à margem.
No jardim da nossa obra, sejam a poesia, a crônica, o conto ou o romance há necessidade de que sejam arrancadas as ervas daninhas da afetação, subserviência, inveja e da cobiça. Há necessidade de se adubar esse jardim com a riqueza mineral da sensibilidade e finalmente regado com a verdade e a clareza, elementos exigidos certamente pelas futuras gerações.
Sinto causar decepção a muitos dos senhores e senhoras por não ter neste pronunciamento ido buscar nos gregos, latinos, nos clássicos da literatura e da filosofia, aquelas citações próprias dos discursos cerimoniosos. Poderia se quisesse citar aqui com afetação e soberba, medalhões do quilate de Baudelaire, Chateaubriand, Cervantes, Vitor Hugo, Fernando Pessoa, Dickens, Camões ou Tolstoi.
Mas fico do lado de cá, entre os nossos e tão próximos e, satisfeito por ter como referências Suassuna, Gilberto Freire, Ledo Ivo, Da Costa e Silva, Silvio Romero, Nabuco, meu amigo de mocidade e orgulho da literatura de Camocim, Raimundo Bento Sotero, Oton Lustosa, Magalhães da Costa, Patativa do Assaré, Firmino Teixeira do Amaral e o nosso genial repentista Pedro Costa. A ciência humana se engrandece mais toda vez que o homem conhece mais suas raízes.
Sou jornalista de vocação e por formação. O que me motiva, o que me credencia estar hoje aqui nas vossas presenças é o povo e é dele que tenho tirado inspiração para tudo aquilo que escrevo. É e sempre foi meu propósito dar ao homem da rua, ao assalariado, ao leitor casual, a mocinha no banco da praça, ao estudante inquieto, ao aposentado, à recepcionista do escritório do doutor fulano de tal, uma leitura suave e o tanto quanto possível tendo relação com a realidade.
Recordo com muita emoção dois colegas, dois radialistas, Cícero Evandro dos Santos, nosso Evander Hollifield, e Jaime Lins. Se vivos fossem estariam aqui nesta primeira fila prontos para apertar a minha mão. Por isso estou aqui, nesta noite inesquecível e entre os amigos, parentes de minha antecessora Edimée Rego Pires de Castro, meus familiares e meus colegas de profissão, aos quais fico profundamente agradecido.
Sou um de vocês, apenas estou mais velho. Estou aqui entre os cardeais da cultura e da literatura parnaibana pedindo licença para entrar nesta casa e consciente de que em me deixando entrar terão os senhores um dedicado e fiel companheiro. Porque todos aqui têm um propósito muito maior, assim como teve minha antecessora Edimée Rego Pires de Castro, servir à cultura e a grandeza da nossa terra, a Parnaíba.
Muito obrigado.