O goleiro e o Gato

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O goleiro e o Gato

Elmar Carvalho

Joguei futebol até os dezoito anos de idade, sobretudo na posição de goleiro, mas também atuando, algumas vezes, na lateral e na ponta direita. O trabalho e meus estudos me impediram de continuar praticando o esporte bretão. Depois, só muito esporadicamente voltei a jogar, mormente após ingressar na magistratura, no time de nossa associação – AMAPI, por um curto período.

Praticamente havia esquecido essa minha faceta esportiva, quando, muitos anos depois, o professor Zé Francisco Marques me disse que eu havia sido um bom goleiro. Como eu lhe tenha dito que já pouco me lembrava de minhas atuações goleirísticas, o Zé Francisco escreveu a crônica “Quem te ensinou a voar?”, que muito me comoveu, na qual descreveu as minhas principais características e uma de minhas defesas. Foi um ato de generosidade, mas o fato é que esse texto se encontra publicado em meu livro “O Pé e a Bola”, assim como na internet.

Portanto, foi motivo de agradável surpresa e regozijo, o Gato, famoso e respeitado árbitro do futebol teresinense, na última comemoração natalina da AMAPI, me haver dito que eu fora um bom goleiro. Ele me viu jogando em algumas disputas do time amapiano. Como eu lhe tenha indagado se falava com sinceridade, ele não só confirmou o que dissera, como ainda descreveu uma “ponte” que fiz para defender um chute do adversário.

Olhou para o campo de futebol, que fica perto de nosso clube social, e apontou para a trave em que eu praticara a defesa. Confesso que fiquei extasiado, no momento em que ele acrescentou que até perguntou se eu havia sido goleiro profissional. Alguns colegas magistrados presenciaram essa conversa, embora possam não ter ouvido o seu conteúdo, em virtude do som musical muito alto.

Eu tinha em torno de cinquenta anos, e foi nessa época que deixei de jogar para sempre, com exceção de uma última partida, que fiz em Regeneração, em que, segundo os presentes, atuei muito bem. Nessa derradeira partida, modéstia às favas, fiz algumas ótimas defesas. Essa minha última atuação como golquíper foi relatada na crônica “Despedida de goleiro”, que também se encontra postada na internet.

Pelo que o amigo e grande árbitro Gato me relatou, a minha defesa pode ser considerada, sem nenhuma falta de modéstia, como uma bela “ponte”, mas não uma ponte qualquer, porém uma legítima e deslumbrante ponte estaiada. Valeu, grande Gato! Muito obrigado.

Sindicato. 

 

*Por Gustavo Rosal.

 

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Uns dias passados fui ao Elizeu Martins, da Pinheiro Machado. Buscava um caixa 24h em um dos espaços do estabelecimento. O horário não era pertinente. Fins de tarde formigam em locais assim. A fila contornava uma parede de seus 3 metros de comprimento. Mas não uso de exatidões, tal ensejo me ignorara o Criador e a genética, tanto que em meus tempos de ensino médio era certa a recuperação em matemática.

Ignoremos os metros e as réguas oculares. Então nada comprometem. Contudo a fila assustava. Uma coisona horrível, os pés impacientes fincados, os olhares julgadores que fingiam dizer, “esse aí tá demorando demais”.

Escurecia lânguida a tarde. As cidades às 17h30 são catástrofes dos sentidos. Contraste mais feio não me recordo. O céu enegrece lindo e sereno enquanto tudo alardeia em movimento na terra.

Os carros zunindo na irritação dos prepotentes por poderem zunir em seus motores. Os cavalos elétricos entrecortando vias e ruas, o som agudo da forrozeira no aparelho consertado do Celta na oficina ao lado, os homens de meia idade e seus olhares eternamente bêbados. As camisas avulsas de times de futebol: Palmeiras, Ferroviário, Caiçara, Fenerbahçe…

A beleza ferida sangra até a meia-noite, quando há espaço para ser beleza na calmaria dos que contemplam. Não há pintor expressionista ou fotógrafo que resista a uma fila no Elizeu. A sobrevivência resta aos cegos tão somente. Eu também sangro como o céu que avermelha e como as cores do caixa.

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Vai-se o homem de boné, a universitária de biologia (como explicita a logo da camisa), vai-se o velhinho de semblante benevolente, vai-se toda uma gama de impacientes. A fila prolonga-se às minhas costas e é metade do que era à minha frente.

Gosto de observar coisas e pessoas. Engraçado dizer, já que tantas foram as vezes em que conhecidos comentaram me encontrar de longe em lugar tal ou tal e acenar sem resposta. Chamam-me desatento. Engraçado dizer… Ao quê das pessoas e das coisas sou atencioso se não às suas identidades?

Por buscar a resposta ando com um caderninho de anotações. Nele não constam nomes. Não leio um Paulo ou Gabriela ou Ana ou Fernando em meu caderno, mas as sublinhas desses nomes, ou talvez as coisas inscritas nas coisas. Desta percepção surgem as crônicas que escrevo.

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Assim, meus olhos desbotados captaram uns calçados: espantei-me no ridículo. Pobres moças e seus tamancos pretos. Que a falta de exatidão me corrija, mas poderiam ter 10 cm os tais tamancos? Todas as funcionárias do supermercado calejavam seus pés em saltos de 10 cm! Ao menos as que avistei da fila do 24h…

Abateu-me um íntimo de desconcerto e revolta para com a administração. Os superiores das moças, os que instituíram uso de tamancos com 10 cm de salto para atendentes cujo ofício se constitui em pé e em andanças diversas… Então, minha vez na fila, o procedimento mecânico e o caminho de saída. Vai-se Rosal. Ficam-se os tamancos e os calos. Existirá algum Sindicato das Atendentes de Supermercado? Por Deus ou pelo diabo, greve aos saltos de 10 cm!

 

*Gustavo Muniz Barros Rosal Benvindo é estudante do curso de Direito no campus da Universidade Estadual do Piauí em Parnaíba, poeta e cronista.

 

REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA

                                                        CONVOCAÇÃO

O Presidente da Academia Parnaibana de Letras – APAL, José Luiz de Carvalho, convoca todos acadêmicos para uma reunião extraordinária, a saber:

Data: 29.12.2017 – sexta-feira

Hora: 16.30 horas

Local: Academia Parnaibana de Letras.

Pauta:

– Prestação de Contas do Exercício 2017 e outros assuntos financeiros;

– Edital para preenchimento da cadeira de nº 27 (Maria Luiza Mota de Menezes);

– Confraternização de Natal e Ano Novo;

– Almanaque da Parnaíba 2018.

 

Antonio Gallas Pimentel – Secretário Geral da APAL

Celular 9 8861 – 2126 WhatsApp

Contamos com a presença de todos

 

 

 

 

A LOCALIZAÇÃO DA FAZENDA BITOROCARA *

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A LOCALIZAÇÃO DA FAZENDA BITOROCARA *

               Não há meio de convencer a um homem que não quer ser convencido.

                         Joaquim Manuel de Macedo

Elmar Carvalho

Todos os maiores historiadores do Piauí afirmam haver existido a fazenda Bitorocara e o seu fundador, Bernardo de Carvalho e Aguiar, a começar pelo mais antigo, o padre Miguel de Carvalho, em sua Descrição do Sertão do Piauí, datada de 2 de março de 1697. O padre Cláudio Melo considera esse documento como um dos mais importantes para os estudiosos de História do Piauí, e que deveria ser de manuseio constante. Quase todos admitem que essa propriedade ficava situada em Campo Maior. Como exceção ou voz discordante, um ou outro admite haver dúvida a esse respeito.

O próprio Pe. Cláudio Melo, no prefácio ao livro Descrição do Sertão do Piauí (Comentários e notas do Pe. Cláudio Melo), após advertir que o relatório do Pe. Miguel de Carvalho exigia acurada leitura, com “reflexão e análise prudente e comparada”, em sua proverbial franqueza e honestidade intelectual, aconselhou:

“Não se arrisquem a conclusões precipitadas. Historiador de alta respeitabilidade, como Odilon Nunes, concluiu que Bitorocara era Piracuruca, quando na verdade é Campo Maior [grifo meu]. Eu mesmo há dois ou três anos escrevi um artigo para ‘Cadernos de Teresina’ que, por sorte, não foi publicado (chegou com atraso). Hoje eu não subscreveria tudo que ali afirmei.”

Todavia, o próprio Odilon Nunes, segundo afirma João Gabriel Baptista em seu livro Mapa Geohistóricos, pág. 41, teria sido pessoalmente convencido por Cláudio Melo de que efetivamente o rio Piracuruca não era o Bitorocara. E ele João Gabriel confessa também ter se convencido de que a razão estava com Melo.

Espancando qualquer dúvida que possa existir sobre a localização de Bitorocara, no livro acima citado, o padre Cláudio, um dos maiores historiadores de nosso estado, afirma, a meu ver de forma categórica e peremptória:

“De início, eu supunha que o riacho Bitorocara era o Surubim, em razão de a Fazenda Bitorocara ser a atual cidade de Campo Maior. A descoberta em Portugal da sesmaria de Dâmaso Pinheiro de Carvalho, nas cabeceiras do riacho Cobras, me fez ver que Cobras é o Surubim. Bitorocara, portanto, ou seria o Longá ou o Jenipapo. Surgiu para mim um impasse: a fazenda Serra fica no Longá e o Jatobá no Jenipapo. Como os limites da fazenda Serra não atingiam o Jenipapo, mas os limites da fazenda Jatobá podiam chegar até o Longá, concluí, por fim, que Bitorocara seria o Longá. A fazenda Bitorocara se expandia pelos três rios, e ela estava na confluência deles.”

Para chegar a essa conclusão, pelo que se depreende de seu conselho (ou advertência), acima transcrito, o notável historiador piauiense leu e releu várias vezes e em profundidade o relatório da lavra de Pe. Miguel, com certeza cotejando-o com os vários documentos que consultou em Portugal e no Piauí, muitos deles transcritos no livro Bernardo de Carvalho, de sua autoria.

O padre Miguel, em seu relatório, indicava os rios em que as fazendas por ele referidas se situavam, preservando dessa forma a sua localização. As fazendas, na época, eram muito extensas. Ele situava três no riacho Bitorocara (Longá): a primeira, de nome Serra, ficava nas cabeceiras; a segunda, Bitorocara, se lhe seguia, e “a terceira e última deste riacho se chama o Jatobá”. Evidentemente a fazenda Jatobá ficava na margem direita do Jenipapo, que desemboca no Longá, podendo ter prosseguimento pela margem direita deste rio, uma vez que, na expressão de padre Cláudio, “a fazenda Bitorocara se expandia pelos três rios, e ela estava na confluência deles”. A linha de raciocínio do historiador obedece à lógica, e não a uma simples ilação tirada do nada, e, portanto, não merece reparo.

Como é sabido por todos, a antiga igreja de Santo Antônio do Surubim foi construída por Bernardo de Carvalho e Aguiar a pedido de seu sobrinho, o Pe. Tomé de Carvalho. Quase sempre (e não conheço exceção) as igrejas eram erigidas pelos fazendeiros nas proximidades da casa-grande ou residência, sempre que possível sobre uma colina ou outeiro, em terras de sua propriedade ou posse. Essa era a praxe na história do Piauí, ainda hoje observada. Quem iria construir uma ermida ou igreja distante de sua casa e fora de sua propriedade? Considerando-se que a fazenda Bitorocara (antigo nome do rio Longá) ficava na margem desse rio é lógico concluir-se que ela ficava nas proximidades da igreja construída por seu proprietário nas imediações do rio Cobras, hoje Surubim.

Sobre isso vejamos o que diz o historiador e genealogista Valdemir de Castro Miranda, em seu trabalho intitulado “Sobre as origens de Campo Maior”, publicado no blog poetaelmar.blogspot.com.br, em 04.09.2015:

“Campo Maior tem sua origem ligada à figura do mestre de campo Bernardo de Carvalho e Aguiar, fundador da Fazenda Bitorocara no ano de 1695, na confluência dos rios Longá com o Surubim. Por volta de 1706, o Pe. Thomé de Carvalho e Silva fez desobriga na região, fundando ali um curato. Mais tarde, com a ajuda de Bernardo de Carvalho e Aguiar, construiu a Igreja de Santo Antônio, batizada a 12.11.1712, com a instalação da Freguesia de Santo Antônio do Surubim ou Longá, a segunda do Piauí e ainda ligada ao Bispado de Pernambuco. O procedimento para a instalação da nova Freguesia, foi o mesmo adotado pelo Pe. Miguel de Carvalho quando da instalação da Freguesia da Mocha, reuniu os moradores da região para definir o local da edificação do templo. Não contando com a ajuda dos arrendatários das fazendas da região, mas com o cel. Bernardo de Carvalho e Aguiar que construiu a capela a suas custas, conforme consta em carta do Pe. Thomé de Carvalho e Silva, Vigário confirmado na Matriz de Nossa Senhora da Vitória do Piauí de Cima em toda ela Vigário da Vara, pelo ilustríssimo Sr. Dom Manuel Álvares da Costa, Bispo de Pernambuco e do Conselho de Sua

Majestade, que Deus guarde:

“Certifico que sendo esta minha Freguesia muito dilatada pelas grandes distâncias, principalmente a ribeira dos Longases, aonde não podia desobrigar a tempo de acudir com os Sacramentos nas necessidades dos meus fregueses residentes nela, pelos muitos rios que tem em meio para esta minha igreja, requeri ao Sr. Bispo de Pernambuco, mandasse fazer Igreja curada na dita ribeira dos Longases, por assim convir ao serviço de Deus, Nosso Senhor, ao que deu logo cumprimento. O dito Sr. Bispo mandou-me ordem para a poder fazer e, indo a esta parte, convoquei os principais moradores e, tomando-lhes os seus votos na parte que havia de erigir a nova Capela, que por invocação tem o nome do Glorioso Santo Antônio, lhe não achei possibilidade para fazerem, dando várias desculpas pelos poucos escravos que tinham, e estando ocupados em fazendas que tinham os seus donos na Bahia as não podiam desamparar. Nestes termos, me vali do Coronel Bernardo de Carvalho que, com pronta vontade, buscou um carapina a quem pagou, e foi pessoalmente com seus escravos ajuntar as madeiras e os mais materiais, trabalhando o dito com grande zelo. E, com efeito, fez a capela à sua custa, tanto de escravos como gastos, farinha e dinheiro. E o acho com ânimo de gastar nela cabedal. Outrossim se me ofereceu com o gado que necessitasse para a nova ereção desta Matriz de Nossa Senhora da Vitória, e me prometeu 200$000 (duzentos mil reis) para uma Custódia para a dita Matriz e que se custasse mais o daria”.

(MELO, Pe. Cláudio. Fé e Civilização, 1991, p. 47-8).

Recentemente uma voz discordante afirma que a Fazenda Bitorocara ficava, aproximadamente, onde hoje estão situados os municípios de São Bernardo – MA, Luzilândia e Campo Largo, os dois últimos no Piauí. O imóvel ficava em ambos os lados do rio Parnaíba. O defensor dessa hipótese parte do pressuposto de que o Arraial Velho e Bitorocara seriam termos sinônimos, e se fundamenta no fato de que Miguel de Carvalho e Aguiar, filho do Senhor de Bitorocara, teria herdado a sesmaria de Arraial Velho de seu pai, conforme documento existente em Belém do Pará, cuja propriedade em favor de Miguel foi confirmada em 1739. Essa informação é verídica e está devidamente documentada. Só um louco ou mistificador a negaria. Aliás, essa notícia é antiga, e já está inserida no livro Cronologia Histórica do Estado do Piauí, da autoria de F. A. Pereira da Costa, cuja primeira edição data de 1909.

Contudo a hipótese de que Bitorocara ficava no rio Parnaíba, na altura de São Bernardo, Campo Largo e Luzilândia, não pode prosperar, e muito menos se estabelecer como verdade, pelos motivos que passarei a expor de forma sintética.

Primeiro, Arraial (velho ou não) nunca foi e não é sinônimo de Bitorocara. É apenas um topônimo genérico, e que designa vários locais do Brasil, e mesmo do Piauí. Assim, no nosso estado existiram vários arraiais, entre os quais cito o que deu origem a Jerumenha, o dos aroases, o dos paulistas, o de Nossa Senhora da Conceição, o dos Ávilas, o que originou a atual cidade e município de Arraial e, evidentemente, o arraial que se formou no entorno da Fazenda Bitorocara e da igreja de Santo Antônio do Surubim, nela situada, etc.

O certo é que o Arraial Velho que deu origem à cidade de São Bernardo (MA) não é e nem poderia ser o arraial velho que formou a cidade de Campo Maior.

Por outro lado, em termos cronológico e documental, Bitorocara jamais poderia se referir ao Arraial Velho do rio Parnaíba, uma vez que o documento a este referente data de 1739, enquanto a referência à fazenda Bitorocara, feita pelo padre Miguel de Carvalho é datada de 1697, conforme seu relatório, publicado sob o título de Descrição do Sertão do Piauí.

Ademais, o seu autor, Miguel de Carvalho, em sua desobriga, que relatou nesse documento, percorreu apenas as terras que ele entendia como pertencentes à freguesia de Nossa Senhora da Vitória, conforme explicitou o padre Cláudio Melo em seus comentários (v. bibliografia): “Outras porções do território piauiense também eram habitadas, mas ficaram excluídas desta Descrição; é o caso dos sertões do Parnaguá (que ficariam na jurisdição de outra freguesia a ser instalada) é o caso do baixo Longá, Piracuruca e litoral que já estavam assistidos pelos Filhos de Santo Inácio, na Ibiapaba.”

Ora, se o padre Miguel de Carvalho sequer percorreu todo o território do atual estado do Piauí, com muito mais razão não poderia ter ido até os atuais municípios de Brejo e de São Bernardo, no Maranhão (em cuja região veio a ser situado o Arraial Velho), que pertenciam a outra jurisdição eclesiástica. Consequentemente, a fazenda Bitorocara a que ele se referiu em seu relatório ficava mesmo no rio Longá, perto de onde fica a atual cidade de Campo Maior.

Em consequência o arraial militar, ou arraial ou ainda arraial velho referente a Campo Maior, que se formou no entorno ou perto da Igreja de Santo Antônio do Surubim, não pode, em hipótese nenhuma, ser confundido com o Arraial Velho maranhense, localizado perto do Parnaíba. Mesmo porque Bernardo de Carvalho e Aguiar, último mestre de campo das Conquistas do Piauí e do Maranhão, só se mudou para a atual cidade de São Bernardo, da qual é considerado fundador, em 1721, quando deixou o seu cargo.

A fazenda Bitorocara, portanto, ante tudo o que expusemos, ficava na confluência dos rios Longá, Surubim e Jenipapo, o que, admitamos, era estratégico, uma vez que haveria suprimento de água para consumo humano e do gado, e para a formação de pastagem, além de que seriam evitados problemas com eventuais confrontantes, porquanto os limites ficariam bem estabelecidos por esses cursos d’ água.

Tudo o que até aqui foi dito faz parte do terceiro capítulo da 2ª edição da versão impressa do livro Bernardo de Carvalho, o fundador de Bitorocara, de nossa autoria (EDUFPI/ACALE, 2016).

Contudo, após essa publicação, o escritor e historiador Reginaldo Miranda, membro da Academia Piauiense de Letras, que se tornou um verdadeiro detetive internético da História e, simultaneamente, um exímio paleógrafo, a decifrar intrincados, carcomidos e quase ininteligíveis e desbotados documentos antigos, às vezes verdadeiras criptografias para muitos historiadores e curiosos, descobriu, em determinado site, um documento que comprova, de forma absoluta e insofismável, que Bitorocara, uma das fazendas de Bernardo de Carvalho, ficava mesmo em Campo Maior. Em matéria postada em meu blog (http://poetaelmar.blogspot.com.br), no dia 23/09/2017), sob o título de A Fundação de Campo Maior, ele transcreve parte desse documento que comprova a sua localização. Vejamos trecho do que ele afirma, com a respectiva transcrição:

“Foi no governo de Christóvão da Costa Freire, governador e capitão general do Estado do Maranhão(1707 – 1718), que lhe foi dada a sesmaria “no sertão dos Alongazes por evocação de Santo Antônio, em um riacho cujas vertentes desaguavam no rio Jenipapo, em o qual tinha todas as fábricas de criados, escravos, cavalos e o mais necessário, e nele necessitava de três léguas de terra de comprido com uma de largo em todo o comprimento, para criação dos ditos gados e suas multiplicações, começando o dito comprimento da casa para Leste duas léguas e da mesma casa para Oeste uma légua, fazendo a largura de Norte a Sul ficando o dito riacho em meio da largura, reservando ele as voltas e pontas e da terra toda a inútil de criar gados, pelo haver povoado estando deserta” (PT/TT/RGM/C/0008. Registo Geral de Mercês, Mercês de D. João V, liv. 8, fl. 509v).

Então, seria impossível uma localização mais precisa, ficando a mesma no sertão do Longá, em um riacho que entra no Jenipapo (o mesmo da Batalha da Independência). E fora erguida sob a invocação de Santo Antônio, em cuja sede foi pelo proprietário iniciada a construção da capela, à sua custa, em 1711, para servir de matriz à freguesia de Santo Antônio dos Alongazes ou Santo Antônio do Surubim, a segunda mais antiga do Piauí, que fora criada naquele ano, pelo padre Tomé de Carvalho e Silva, sob ordens do Bispado de Pernambuco.”

Por via de consequência, se antes eu tinha a convicção de que Bitorocara ficava em Campo Maior, na confluência dos rios Surubim, Longá e Jenipapo, seguindo as pegadas e lições do Pe. Cláudio Melo, agora, com fundamento no documento “decifrado” e analisado por Reginaldo Miranda, tenho a certeza absoluta quanto a esse fato histórico, que não mais pode ser questionado ou contraditado.

* Matéria republicada com acréscimo e transcrição de trecho de novo documento, que comprova de forma definitiva que Bitorocara ficava mesmo em Campo Maior.

Instituto Federal promove Salão de Literatura.

                       Com o tema ” Um Olhar Sobre a Literatura e Expressão Piauiense”  o Campus do Instituto Federal do Piauí em Parnaíba,   abrirá suas portas  na próxima terça-feira, 19, para receber estudantes,  escritores, poetas, enfim  todos os amantes da literatura  para a apresentação do SALIFPI ( Salão de Literatura do Instituto Federal do Piauí) .  O evento que terá início às 09 horas da manhã  se estenderá até às 17 horas.  O Campus do IFPI em Parnaíba fica localizado  na  Rodovia BR-402, Km 3, s/n – Baixa do Aragão. A BR 402 é a estrada que liga Parnaíba a Chaval no Ceará.

Meu pai e a sua Ítaca encantada

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Meu pai e a sua Ítaca encantada

Elmar Carvalho

Na tarde de domingo, dia 5 de novembro, após um breve cochilo, senti um forte, porém agradável cheiro de flores*, perto da rede em que eu repousava. Sabia que era um sinal. Entretanto, por cautela, perguntei a Fátima, minha mulher, e a minha filha Elmara se haviam usado algum tipo de perfume, sabonete ou desodorante. Ante a resposta negativa, não tive dúvida; meu pai, que se encontrava na UTI da Unimed, havia falecido. De fato, um pouco depois, meu celular tocou, e nesse telefonema meu irmão Antônio José me comunicou o falecimento de papai – Miguel Arcângelo de Deus Carvalho.

Esse fenômeno, o cheiro de flores, sobre o qual não desejo emitir nenhuma explicação ou justificativa, me ocorreu pela primeira vez em junho de 2013, de madrugada, na cidade de Regeneração, alguns dias após o falecimento de minha mãe. Digo apenas que o entendo como um sinal de que existe algo mais do que apenas esta efêmera vida terrena, com os seus percalços e vicissitudes, em diferentes etapas de nossa trajetória existencial. Creio que ele é dado para vivificar a nossa Fé e para aumentar a nossa coragem e Esperança, bem como outras virtudes.

Se fosse projetado o filme da vida de meu pai, com certeza a tela não teria apenas uma luminosidade vazia, destituída de imagens, como a daquele ermitão, que se limitou a não fazer o mal em sua gruta solitária, mas que também não praticou boas ações no convívio com outras pessoas, talvez no egoísmo de alcançar o céu a qualquer preço. Papai teve, como todos nós, as suas alegrias e tristezas, as suas conquistas e decepções, sobre as quais não irei aqui discorrer.

Aos 14 anos de idade, quando era aluno do Colégio Diocesano de Teresina, perdeu o pai, meu avô João de Deus, tendo que retornar a Barras, sua terra natal. Na maturidade, sofreu a perda de sua filha Josélia, quando ela tinha apenas 15 anos de vida. Em sua velhice, no final de abril de 2013, amargou a morte de sua amada esposa, minha mãe, que cuidou dele e dos oito filhos com exemplar e inexcedível dedicação. Faleceu em 5 de novembro de 2017, no dia em completava (exatamente) 91 anos e 10 meses de existência.

Gostava de ler, sobretudo romances, contos e poemas, mas também livros religiosos. Tinha uma pequena biblioteca, que li em minha infância. Tomava emprestados livros de biblioteca públicas e particulares para que eu os lesse em casa. Gostava de música, principalmente as da velha guarda, que ouvia em programas radiofônicos, como o Gramofone da Vovó, apresentado pelo locutor Jaime Farell, através da Rádio Sociedade da Bahia, se não estou equivocado. Recitava de cor alguns desses poemas e cantarolava várias dessas músicas, cujas letras eram na verdade belos poemas. Durante algum tempo foi colaborador do jornal A Luta, de Campo Maior, com artigos ou crônicas, que escrevia em linguagem elegante e escorreita, mas sem nunca ter alimentado veleidade literária.

Não tinha pretensão artística porque sua meta primordial era sustentar sua família, composta por minha mãe e oito filhos. Seu esforço maior foi sempre cumprir suas funções, para conservar seu emprego, embora tivesse estabilidade em seu cargo efetivo, já que era servidor público federal, até se tornar celetista, quando o antigo DCT – Departamento de Correios e Telégrafos foi transformado em empresa pública.

Tenho lembrança de ter ido com ele, em minha infância, assistir exibição de filmes no velho Cine Nazaré, espetáculos de circos que aportavam em Campo Maior, bem como fui com ele ao Estádio Deusdete Melo, para presenciarmos acirradas disputas futebolísticas, mormente entre os arquirrivais Comercial e Caiçara. Com ele fui, algumas vezes, participar de missas na igreja de Santo Antônio do Surubim, e até mesmo a desobrigas efetuadas pelos saudosos vigários Mateus Cortez Rufino e Isaac Vilarinho.

Prezando sobretudo a qualidade, teve seletos amigos ao longo de sua vida, cuja amizade cultivou e preservou, e dos quais recebeu idêntica e reciproca consideração. Tendo chefiado a ECT – Empresa de Correios e Telégrafos – em Parnaíba, por muitos anos, angariou a estima e a consideração de seus servidores, sendo que quase todos tinham idade de ser seus filhos, já que a maioria dos antigos servidores não optou em pertencer ao regime da CLT, adotado pela empresa criada a partir do antigo Departamento. Não lhes chamava a atenção em público, mas os orientava reservadamente, na sala da chefia. Teve a percepção antecipada de que o alcoolismo era uma espécie de doença, de modo que nunca propôs a demissão e punição de ninguém, em raros casos isolados que surgiram, para os quais encontrou solução menos drástica.

Dele recebemos bons conselhos e bons exemplos, que não desejo especificar, exceto um: numa época em que não havia cartão de crédito nem de débito, quando recebia algum dinheiro a mais, em troco ou em saque bancário, ato contínuo retornava para devolver a importância excedente que lhe fora indevidamente entregue.

No dia do seu sepultamento em Campo Maior, houve missa** de corpo presente na igreja de N. S. das Mercês. O padre Expedito Melo, em perfeita celebração, proferiu belas e confortadoras palavras sobre meu pai, que nos comoveram. Logo após a missa, em momento de muita inspiração, o grande tribuno João Alves Filho pronunciou lapidar necrológio, em que ressaltou as boas qualidades de um homem simples e bom, que se chamou Miguel Arcângelo de Deus Carvalho.

A caminho do cemitério em que papai foi sepultado, dentro de meu carro, a Maria Francisca, que foi nossa vizinha na primeira metade dos anos 1970, nos prestou comovente depoimento, cujo teor desconhecíamos. Ela disse que, algumas vezes, o papai lhe dava pequena ajuda, para que ela comprasse cadernos e outros materiais escolares, e que, muitas vezes, lhe advertiu para que nunca desistisse de seus estudos, esclarecendo-lhe que esse era o único meio de uma pessoa pobre melhorar de vida. Respondi-lhe que nessa época ele atravessava situação financeira difícil, pois ainda não ascendera a novo cargo em seu emprego, e sua família era grande. Ela respondeu, com a voz embargada pela emoção, que sabia disso.

Com a morte de mamãe, com quem viveu em admirável e longa união, em amizade e respeito recíprocos, meu pai começou a declinar em sua energia vital. Contudo, mesmo faltando apenas dois meses para completar 92 anos, se manteve lúcido e se locomovendo com suas próprias pernas, com exceção dos momentos em que esteve na UTI, onde faleceu.

Com Fé, Esperança e coragem alicerçada em fervorosas orações, enfrentou as vicissitudes momentâneas de sua longa vida. Combateu o bom combate dos homens de bem, dos homens que acreditam em Deus e na vida eterna.

Parafraseando o notável poema de Konstantinos Kaváfis, direi que a vida de papai foi uma bela viagem, com pequenas turbulências e bonanças, mas com o descortino de deslumbrantes paisagens, e que, em coroamento, ele encontrou Ítaca, a sua ilha encantada.

* Vê a crônica Cheiro de Flores, que se encontra publicada na internet.

** As missas de corpo presente e de sétimo dia contaram com o apoio logístico do amigo José Francisco Marques e com a boa vontade e compreensão do celebrante, Pe. Expedito Melo. Tiveram a presença de familiares e amigos da família, aos quais somos gratos.

Carta/resenha de Histórias de Évora (*)

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Carta/resenha de Histórias de Évora (*)

Meu caro mestre Elmar,

Foi quase de uma sentada só, de um único folego que li seu livro Histórias de Évora.  Acredito que seu primeiro romance, visto que de sua lavra conheço ensaios, contos e poesias. Foi sem dúvida uma bela estreia, merecendo todas as congratulações pela iniciativa e mais ainda pela criatividade.

Como você mesmo confessa a obra contém certas histórias vividas pelo autor, por amigos e outras concebidas pela imaginação criadora, todas elas adaptadas ao contexto pretendido.

Confesso que Histórias de Évora me levaram à juventude vivida em minha Floriano, nada diferente da sua cidade fictícia, iguais às nossas do interior. Recordei várias passagens vividas por mim e amigos daquela época, alguns dos quais perdi o contato ao longo da vida, mas que agora vieram à mente com o gosto da saudade.

Relembrei a retreta dominical na praça Sebastião Martins, sempre sob a batuta do Mestre Eugênio. As salas de aulas do Educandário Santa Joana D’Arc e do Ginásio Santa Teresinha e assim muitos professores a quem devo os primeiros passos de minha formação. Foi fácil voltar à memória o Bar São Pedro, a Sertã, o Flutuante, que ainda sobrevive. Seu livro também me fez recordar o Bumba meu Boi que Né Preto comandava no mês de julho e terminava sempre nas margens do rio Parnaíba, onde o boi ia beber água. Foi ótimo relembrar os carnavais com os blocos Os Piratas, Os Malandros, o Bota pra Quebrar, Os Pilantras, onde todos se divertiam sadiamente visitando casas familiares previamente selecionadas para ali cantar, tocar, comer e beber por conta da gentileza dos anfitriões. Foi muito bom voltar à memória a nossa “Zona Planetária” onde pontuavam o Maracangalha, a Eva, a Pretinha, todos fazendo parte do complexo Pau num Cessa.

Creia-me meu caro poeta, Histórias de Évora foi uma leitura gostosa em muitos sentidos, mas confesso o saudosismo, aquele que nos traz de volta a vivências agradáveis, foi o sentido maior.

Parabéns, meu caro mestre. Estou ansioso pela próxima obra que com certeza já está na forma.

Seu sempre admirador

Cristóvão Augusto de Araújo Costa

(*) Carta internética (e-mail) enviada pelo autor, após a leitura de Histórias de Évora, romance de Elmar Carvalho. Cristóvão Augusto é servidor público federal aposentado e é um dos editores da Coleção Florianenses, importante periódico publicado pela Fundação Floriano Clube.

EU GOSTO DE TE CHEIRAR

 

Imagem meramente ilustrativa

 

EU GOSTO DE TE CHEIRAR

 

Antonio Gallas

 

Eu gosto de te cheirar!

Teu cheiro,

Tem um cheiro diferente!

Tem um cheiro de perfume,

Tem um cheiro de ciúme,

Tem um cheiro que ninguém tem…

 

Eu gosto de te cheirar!

Teu cheiro,

É um cheiro que me faz bem!

Um bem que a gente sente

Quando se cheira alguém

Que a gente quer muito bem!

 

Eu gosto de te cheirar!

Teu cheiro,

Tem cheiro de tudo!

Tem cheiro de mato,

Tem cheiro de flor,

Tem cheiro de amor!

 

Eu gosto de te cheirar!

Teu cheiro,

Tem cheiro da natureza

Tem cheiro de magia,

Tem cheiro de beleza,

Tem cheiro de poesia!

 

Eu gosto de te cheirar!

Teu cheiro tem um cheiro diferente.

Tem cheiro de sedução,

Cheiro que faz bem pra gente,

Pra alma e pro coração!

 

 

O CENTENÁRIO DE CLÁUDIO PACHECO

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O CENTENÁRIO DE CLÁUDIO PACHECO

Elmar Carvalho

Foi hoje a primeira sessão da Academia Piauiense presidida pelo historiador Reginaldo Miranda. Os acadêmicos manifestaram suas felicitações e lhe desejaram uma profícua administração. O presidente, talvez para mostrar o seu intuito de que deseja trabalhar vigorosamente em prol da instituição, já apresentou um número do boletim Notícias Acadêmicas, cuja regularidade prometeu retomar, assim como prometeu “zerar” as edições atrasadas da Revista da Academia.

Na continuação dos trabalhos, em que vários assuntos importantes foram abordados, o acadêmico Celso Barros Coelho assinalou que o centenário de acadêmico deve ser comemorado por sua academia, uma vez que a sua imortalidade é a sua presença espiritual, é a lembrança e o estudo de sua obra, e que a Academia não se lembrou de comemorar o centenário de nascimento de Cláudio Pacheco, sobre o qual teceu comentários elogiosos, informando que a Justiça Federal, Seção do Piauí,  comemorou a efeméride, tendo ele proferido uma conferência no auditório de sua sede.

Paulo Nunes, em aparte, informou que o Conselho Estadual de Cultura se lembrou dessa centúria, inclusive tendo sido publicado na revista Presença, editada por essa entidade, um artigo de Celso Barros sobre ele, como  constitucionalista. Cláudio Pacheco foi deputado estadual, suplente de senador, consultor jurídico do Banco do Brasil, advogado, professor, jornalista, escritor e poeta. Nasceu em Campo Maior, em 11.05.1909, e faleceu em Teresina, em 14.03.1993, poucos meses após a morte de sua mulher. Suas principais obras são: História do Banco do Brasil, Tratado das Constituições Brasileiras (14 volumes), Luzes e Água na Planície (poesia), As Pedras Ficaram Magras (romance) e Roda Viva (romance).

As obras meramente doutrinárias sobre determinada Constituição, quando esta é substituída por outra, inevitavelmente terminam por perder a importância, mormente no que tiver de mais específico. Entretanto, o Tratado das Constituições Brasileiras, de Cláudio Pacheco, sempre atrairá o interesse dos juristas e doutrinadores, uma vez que analisa crítica e historicamente as Cartas Magnas do Brasil, mostrando os seus defeitos e virtudes, as suas evoluções e eventuais involuções, à luz da doutrina, sobretudo a francesa, e de possíveis estudos comparativos.

6 de fevereiro de 2010

POSSE NA APAL – DISCURSO DE RECEPÇÃO

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(Discurso proferido por Alcenor Candeira Filho , no auditório

do CMRV/UFPI, em 25.10.2017, na solenidade de posse do acadêmico

Manuel Domingos Neto).

Idealizada por José Pinheiro de Carvalho e fundada em 23.07.1983 por um grupo de seis pessoas, a Academia Parnaibana de Letras foi instalada solenemente em 19.10.1983 – Dia do Piauí -,  com a posse conjunta de dezoito acadêmicos fundadores. Recentemente realizou-se outra inesquecível solenidade de posse de quatro novos confrades: Antônio de Pádua Marques Silva, Antônio Gallas Pimentel, Breno Ponte de Brito e  Roberto Cajubá da Costa Brito.

A Academia Parnaibana de Letras ampliou, em 2017, de 35 para 40 membros efetivos e elegeu por aclamação os seguintes acadêmicos: Paulo de Tarso Mendes de Sousa (Patrono: Antônio José de Sousa), Manuel Domingos Neto (Patrono: José Rodrigues de Melo e Silva), José Hamilton Furtado Castelo Branco (Patrono: Epaminondas Castelo Branco), Francisco Valdeci de Sousa Cavalcante (Patrono: Gerardo Ponte Cavalcante) e Marco Antônio Siqueira (Patrono: Evandro Lins e Silva).

Foi com alegria  que recebi  do acadêmico Manuel Domingos Neto a incumbência de fazer o discurso de recepção.  Cabe a cada empossado reportar-se aos respectivos patronos. Aproveito o ensejo para dizer que conheci a todos eles e por todos  sempre tive grande admiração e respeito.

São também de amizade, admiração e respeito os laços que me unem aos cinco novos acadêmicos, particularmente os três que hoje tomam posse como membros da APAL.

Trata-se  de   velhos e queridos amigos, ao lado dos quais já participei de vários projetos culturais e educacionais executados na cidade. Há pouco tempo publiquei em portais e blogues piauienses um depoimento sobre Manuel Domingos,  de modo que não há como não conservar neste discurso a essência do que disse anteriormente.

Ao longo de décadas tive conhecimento de importantes episódios  de que ele participou como intelectual e idealista.

Manuel Domingos Neto é  uma pessoa que a vida inteira vem praticando as virtudes de vida exemplar – decência, bondade, estudo e trabalho -, aliadas a forte inclinação para o combate corajoso em defesa das classes marginalizadas.

Dois anos mais novo do que eu, não me lembro de ter conhecido Manuel Domingos na infância e adolescência, apesar de eu ter nascido e crescido em casa bem próxima do estabelecimento comercial de seu avô, Ranulpho Torres Raposo, na avenida Presidente Vargas.

O primeiro contato com ele ocorreu em fins de 1983 e logo depois ele me enviou o livro que escreveu em parceria com o professor Geraldo Almeida Borges – SECA SECULORUM, FLAGELO E MITO NA ECONOMIA RURAL PIAUIENSE, editado pela Fundação CEPRO, com a seguinte dedicatória:

Alcenor,

Foi uma alegria ter te conhecido.

Tenho certeza de que temos muita coisa para fazer nesta terra.

É preciso, sobretudo, não perder tempo!

Aguardo notícias.

Um grande abraço.

Manuel Domingos.

The, 19.01.84.

No ano seguinte Manuel Domingos me pediu uma colaboração para a 60ª edição do ALMANAQUE DA PARNAÍBA, fundado em 1924 por Benedicto dos Santos Lima, o Bembem, que o manteve até 1941, com 18 edições, e que a partir de 1942 passou a ser dirigido por seu avô Ranulpho Torres Raposo, responsável por, 41 edições ininterruptas (1942/1982).

No  auge da mocidade, estudante do curso de história da Universidade Federal do Ceará, concluído em 1971, Manuel Domingos engajou-se com muito entusiasmo na ação política estudantil como membro da AÇÃO POPULAR-AP, organização política clandestina de esquerda extraparlamentar, influenciada pelo socialismo de fundo católico e que, segundo a Wikipédia, buscava “inspiração ideológica em Emmanuel Mounier, nos jesuítas Teilhard de  Chardin e Henrique Cláudio de Lima Vaz, Jacques Maritain e no dominicano Louis-Joseph Lebret”.

A AÇÃO POPULAR foi constituída por líderes estudantis, destacando-se Herbert de Sousa (Betinho), Aldo Arantes, Vinícius Caldeira Brant. Alguns de seus membros chegaram a exercer, com a redemocratização do país, relevantes cargos públicos, como José Serra, Cristóvem Buarque, Plínio                                       de Arruda Sampaio  e Manuel Domingos Neto, que foi deputado federal,  e vice-presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico-CNPq.

Por conta de sua militância contra a ditadura militar de 1964, Manuel Domingos foi preso, torturado e expulso do país. Morou na Inglaterra e na França, onde fez doutorado em História na Universidade de Paris.

Retornando ao Brasil foi professor da Universidade Federal do Ceará e da Universidade Federal Fluminense, além de pesquisador da Fundação Getúlio Vargas, Ministério da Agricultura e Fundação CEPRO.

Nessa brilhante carreira acadêmica de Manuel Domingos Neto, destaca-se a sua permanente colaboração científica em TENSÕES MUNDIAIS  –  Revista do Observatório das Nacionalidades – a partir da primeira edição, que publicou um dos mais importantes artigos do novel acadêmico: “O Militar e a Civilização”, trabalho que foi traduzido para o inglês.

Manuel Domingos Neto foi um dos fundadores da ABED  –  Associação Brasileira de Estudo de Defesa  -, sediada no Rio de Janeiro e de que foi presidente.

Publicou vários livros, destacando-se O QUE OS NETOS DOS VAQUEIROS ME CONTARAM, “que destaca a criação extensiva de gado bovino na construção do Brasil, os problemas do desenvolvimento socioeconômico regional e a reprodução do  poder político no meio rural nordestino”.

Sobre esse livro esclarece o autor: “Eu busquei fazer uma reprodução do poder da época. Desde as figuras mais importantes da história do Piauí no século XX, até os seus grandes inimigos. Isso tudo partindo dos depoimentos colhidos em 1984, quando eu tinha aberto um laboratório oral em Teresina”.

Outra obra importante de sua lavra, em parceria com Geraldo Almeida Borges, é SECA SECULORUM, FLAGELO E MITO NA ECONOMIA RURAL PIAUIENSE, “resultado de mais de dois  anos de pesquisas em fontes primárias e secundárias, com o objetivo de desvendar as características básicas do complexo fenômeno da ‘seca’ no Estado do Piauí”, como disse Antônio Adala Carnib, superintendente da Fundação CEPRO.

Natural de Fortaleza-CE (1949), Manuel Domingos Neto é filho de Pedro de Castro Pereira e Florice Raposo Pereira. Tem três filhas e é casado com a arquiteta e professora Diva Maria Freire Figueiredo.

Atualmente reside em Parnaíba, onde como professor visitante da Universidade  Estadual do Piauí-UESPI trabalha nas áreas de pesquisa, ensino e extensão e vem se dedicando à recuperação do prédio da avenida presidente Vargas em que seu avô manteve atividade empresarial, com o propósito de nele instalar o Gabinete de Leitura Ranulpho Torres Raposo.

Apesar de ser uma das cidades do Nordeste brasileiro de grande tradição cultural, tendo hoje diversas faculdades públicas e privadas (inclusive duas de medicina), com cerca de treze mil universitários, – Parnaíba é dotada de poucas bibliotecas, destacando-se pelo acervo de livros e revistas, organização, direção e atendimento ao público a do SESC/CAIXEIRAL e a do Campus Ministro Reis Velloso/Universidade Federal do Piauí.

Na administração de Mirocles de Campos Veras, foi inaugurada em 1942 a Biblioteca Pública Municipal, que leva o nome desse grande médico e administrador, estruturada e organizada de conformidade com as instruções do Instituto Nacional do Livro.

Ao longo de 75 anos de existência a biblioteca pública de Parnaíba mereceu pouca atenção dos gestores municipais, encontrando-se atualmente em precárias condições de instalação e funcionamento e com acervo completamente desatualizado e desorganizado, além de pouco frequentada pela população.

Em qualquer cidade, especialmente nas que possuem poucos espaços culturais, como ocorre em Parnaíba, a biblioteca pública deveria ser a instituição cultural mais importante no município.

Pelo acesso fácil e direto, as bibliotecas concorrem para a formação de leitores e promoção do hábito de  leitura, indispensáveis à informação e à transmissão de conhecimentos.

A missão essencial de centro de difusão cultural de uma cidade só pode ser cumprida se suas bibliotecas dispuserem de acervo constantemente renovado com publicações de diversos gêneros artísticos, científicos e filosóficos, bem como com equipamentos e funcionários suficientes para mantê-las em funcionamento.

A biblioteca moderna necessita não apenas de bom acervo de livros e revistas, mas também precisa ser informatizada de modo a propiciar aos frequentadores pesquisas na internet e acesso a CDs e DVDs.

O Gabinete de Leitura vai dispor de um acervo de cerca de sete mil livros, fazendo parte desse acervo a coleção completa do ALMANAQUE DA PARNAÍBA, com 70 edições.

Até hoje, já perto dos 70 anos de idade, Manuel Domingos Neto vem se comportando e agindo  publicamente com a mesma força do ideal que conduziu seus passos na mocidade. Recentemente o vi no meio do povo, na praça da Graça, em Parnaíba, ouvindo atentamente os oradores que se pronunciavam na concentração cívica de apoio à Greve Geral do dia 28 de abril de 2017 realizada em todo o país. A cada grito de  –  Fora Temer!  –  erguia o braço direito, punho cerrado, com o mesmo entusiasmo de outrora e de sempre. E eu cá comigo: Puxa, por que não chamam o Manuel Domingos para falar? Eis que ao  final da concentração, lá estava o grande professor com o microfone na mão. Compreendi então que o deixaram para o final para que a festa popular, de que jamais  me esquecerei, fosse encerrada com chave de ouro.

Senhoras e Senhores,

 

Senhores e Senhoras,

A nossa academia tem sido comandada em todos os períodos de existência por diretorias responsáveis e competentes, como a atual, presidida por José Luís de Carvalho.

Apesar das dificuldades materiais, a academia vem acumulando boas conquistas no plano imaterial através, por exemplo, da publicação de dez edições do ALMANAQUE  DA PARNAÍBA, de lançamentos de livros, de promoção de concursos literários e do ingresso de sete acadêmicos empossados em 2017 e de dois outros que tomarão posse brevemente.

Acadêmico Manuel Domingos Neto, a Academia Parnaibana de Letras o recebe com muita alegria